Comentarista diz observar a destruição da família tradicional e culpa as famílias arco-íris

Não sou contra a união civil entre homossexuais. Nem sequer sou contra a adoção de crianças por homossexuais. Muitas delas terão uma vida melhor do que teriam se não fossem adotadas. E, parece-me, que o critério da qualidade da vida das crianças, deve ser o mais importante de todos. Mas um casal de homossexuais não é o mesmo que um casal de heterossexuais e uma família com mães (ou pais) de mesmo sexo não é o mesmo que uma família com mãe e pai. Dois pais não substituem uma mãe e duas mães não substituem um pai.

Há títulos que deixam desde logo adivinhar o conteúdo que lhes segue. Ora, “Em defesa da família tradicional” não podia deixar mais claro ao que vem. O comentarista deste artigo entra assim numa lógica de acusações apocalípticas contra o Bloco de Esquerda, mas isto é muito mais que uma guerra partidária, é uma afronta às famílias portuguesas, todas elas.

Pelo que se lê acima e percebe, o comentarista é contra o casamento entre pessoas do mesmo sexo (porquê não explicou aqui, mas a escolhas das palavras não é inocente), e nem é contra a adoção por parte de pessoas homossexuais (individualmente e como casal, deduzo), mas imaginem se fosse!

Se o critério da qualidade de vida da criança adotada (ou, vá, o superior interesse da criança, como muitas vezes desvirtuam) fosse realmente o mais importante, não escreveria que dois pais (ou duas mães) não substituem uma mãe (ou um pai). Diria até que um pai ou mãe não substituem outro pai ou mãe. Mas para que tal acontecesse seria necessário haver em simultâneo estas duas entidades. Numa criança dada para adoção tal não acontece, não há pai nem mãe e por isso tenta encontrar-se-lhe uma família que a ame e proteja. Simples, não?

Um país com políticas públicas para proteger a família tradicional, por exemplo que reforcem a igualdade profissional entre as mães e os pais, ou que promovam a natalidade, será um país com uma sociedade mais forte e com maior coesão social.

Colocar a proteção das famílias, todas elas, numa abordagem que coloca umas contras as outras é simplesmente sensacionalista. A igualdade profissional entre mães e pais deverá ser uma preocupação transversal na sociedade, com ganhos óbvios para todos e todas. Quando o comentarista refere na promoção da natalidade talvez não tenha presente a implementação da PMA que permite, por exemplo, que duas mulheres possam ser mães. Talvez não tenha igualmente presente que esta é também uma técnica ajuda vários casais heterossexuais a terem crianças. Não precisa, pois, de especificar a proteção a um único tipo de família. Porque, tão observador que é, rapidamente conseguirá vislumbrar a existências de múltiplos modelos de famílias. Basta querer ver.

Estes modelos familiares, totalmente validados quer clinica como psicologicamente, apesar da sua negação perante décadas de estudos científicos, podem ser constituídos por pessoa singular ou casal (onde até estão incluídas em larga escala as famílias tradicionais que o comentarista diz estarem a ser atacadas, imagine-se!). E o critério é que a criança seja amada e protegida.

E agora pergunto, “protegida de quê?” Bem, entre muitas outras coisas, diria que é obrigação de pais e mães protegerem as suas crianças de comentários preconceituosos como os do comentarista, onde o seu amor e dedicação que nutrem pelos seus filhos e filhas são colocados em causa, numa balança de comparação cruel, como se o Amor se pesasse, como se o Amor de alguém pudesse ser comparado ao Amor de outrem. O Amor não se mede, sr. comentarista, deixe as famílias fora dos seus preconceitos que a sociedade agradece.

Por Pedro Carreira

Ativista pelos Direitos Humanos na ILGA Portugal e na esQrever. Opinião expressa a título individual. Instagram/Twitter/TikTok/Mastodon/Bluesky: @pedrojdoc

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