A Homossexualidade Negra

Se a homossexualidade é, já por si e ainda, um dos temas mais fracturantes da sociedade, há um grupo de gays que tem sido ainda mais confrontado com a homofobia ou, pior, ignorada a sua existência: os negros.

Tenho constatado ao longo dos anos, quer na Internet quer no meu contacto com pessoas negras no dia-a-dia, que há, com alguma frequência, quem se recuse a admitir que os negros possam ser gays, que “ser gay é uma coisa de brancos” (sim, ouvi isto).

É um tipo específico de homofobia que ataca um grupo de pessoas que sofrerão também discriminação racial, sendo assim duplamente vítimas. Mais! Tenho encontrado este tipo de homofobia vindo de (algumas) pessoas negras o que me faz pensar que se possa tratar de um caso em que o fanatismo religioso e o desconhecimento ganham peso para “justificar” tais palavras de ódio. É dentro do próprio grupo que surge esse ódio e essa negação o que não deixa de ser ainda mais preocupante dado que a luta anti-racismo é, na essência, igual à luta anti-homofóbica em que os princípios de igualdade e respeito são pilares de ambas. É por isso que me deixa chocado quando vejo alguém a espalhar esse tipo de comentário homofóbico baseando-se nas mesmas premissas que, directa ou indirectamente, um outro grupo de pessoas racistas teve sobre eles.

Há que deixar as coisas bem explícitas: a homossexualidade não conhece raça, profissão, estatuto, religião, idade, loiro, ruivo, direito ou esquerdo, a homossexualidade existe, provavelmente bem perto de todos nós quer o saibamos quer não, e o reconhecimento desse facto é um passo essencial para o fim da discriminação, porque nós gays estamos aqui, fazemos parte da vida da sociedade, somos brancos, negros, asiáticos, fazemos parte de todas as culturas, de todas as ciências e religiões, somos o que somos e todos já nos viram, beijaram e abraçaram, já nos tocaram. Deixem que, ao nos assumirmos, isso deixe de ser um problema. E não nos neguem, muito menos pela cor da pele.

Nota: Fotografia de Zanele Muholi.