Cinema: “Tom Na Quinta” De Xavier Dolan

Tom Na Quinta (Tom À La Ferme no original) de 2013 marca o quarto filme de Xavier Dolan, onde é actor e realizador mas, e pela primeira vez, não foi argumentista exclusivo; baseando-se a história na peça de teatro do mesmo nome e da autoria de Michel Marc Bouchard, Dolan desta vez partilha o argumento com Michel. E a história que o filme conta é bem simples: após a morte inesperada do seu namorado, Tom viaja até à quinta para conhecer a família deste e participar no seu funeral. Mas a mãe do namorado, Agathe, alimentada por mentiras do seu outro filho, Francis, julga que o defunto filho tinha uma relação com uma rapariga. Tom chega à quinta, portanto, como amigo.

Não fugindo ao seu estilo visual, Tom Na Quinta marca um afastamento de Dolan na forma como é apresentada a história. O filme, embora altamente dramático pela natureza trágica das suas personagens como o realizador bem nos habituou, aqui existe uma componente de perigo eminente, porque Francis impõe a Tom, muitas vezes através da força, a ilusão na mente da mãe para que esta consiga ser feliz e não perceba que o seu desaparecido filho era homossexual.

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O filme consegue criar ambientes completamente asfixiantes apenas pela tensão que o diálogo e a reação (ou não-reação) das personagens impõem, tornando-se rapidamente num thriller que nos prende até ao seu desfecho. Mas não sem antes explorar uma relação de abuso que Francis cria com Tom, nunca se percebendo por completo as reais intenções do primeiro; se este quer apenas que Tom apoie a sua história da namorada do irmão sem revelar que é ele afinal o namorado do mesmo; ou se Francis, na realidade, deseja Tom e alicia-o com lutas corporais, danças e meias palavras, obrigando assim Tom a permanecer na quinta, fazendo-lhe companhia.

Tom não consegue escapar e, quando Francis lhe desmonta o carro impedindo-o de fugir, parece resignar-se ao seu novo rumo. Sofrendo algo próximo do síndrome de Estocolmo, Tom tenta aproximar-se de Francis e perceber quais as suas convicções, quais os segredos que guarda e que, durante o filme, vão sendo dadas pistas de um episódio de brutalidade extrema. São esses segredos que mantêm o resto da população afastada daquela família.

Mais uma vez Dolan consegue inserir uma história com personagens LGBT e, no entanto, ser um filme absolutamente universal e, mais importante até, não existe uma demonização dessas personagens como acontece em muito cinema do género. É um filme que, tal como a personagem do Tom, nos obriga a pensar no que a verdade significa para nós, quanto vale uma ilusão e, por fim, até que ponto nos prendemos ao nosso próprio passado e aos nossos próprios males?

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