Krzysztof Charamsa E A Desumanidade Do Vaticano

Krzysztof Charamsa, o padre polaco que no início do mês assumiu a sua homossexualidade e que tem uma relação num aparato mediático, acusou o Vaticano – numa carta dirigida ao Papa Francisco agora divulgada pela BBC – de “perseguir” e de causar um “sofrimento incomensurável” aos católicos homossexuais e às suas famílias.

Charamsa diz que decidiu assumir publicamente a sua orientação sexual após “um longo e angustiante período de avaliação e oração“, para “repudiar publicamente a violência da Igreja em relação às pessoas homossexuais, lésbicas, bissexuais, transgénero e intersexuais“.

Apesar de a hierarquia da Igreja Católica estar “cheia de homossexuais“, ela é “muitas vezes violentamente homofóbica“, critica, apelando “a todos os cardeais, bispos e padres gay que tenham a coragem de abandonar esta Igreja insensível, injusta e brutal“.

Charamsa diz que já não consegue conviver com “o ódio homofóbico da Igreja, com a exclusão, a marginalização e a estigmatização de pessoas como” ele, cujos “direitos humanos são negados” pela hierarquia.

O Vaticano reagiu na altura às declarações de Charamsa que ainda é formalmente padre da Igreja Católica, mas foi afastado das suas funções na Congregação para a Doutrina da Fé, onde trabalhava desde 2003: “A escolha de fazer uma manifestação assim tão clamorosa na vigília da abertura do sínodo é muito grave e não responsável, porque tem a finalidade de submeter a assembleia sinodal a uma indevida pressão mediática“, disse o padre Federico Lombardi, director do gabinete de imprensa da Santa Sé.

Bem, dada a notícia, por onde começar? A pressão mediática que o Vaticano alega ter sofrido devido às declarações do padre Charamsa pouco interesse tem para a questão. A denúncia de casos como este elevam-se perante qualquer tipo de pressão que a toda-poderosa-Igreja-Católica possa sofrer. Não espere a milenar instituição que o público desvie o olhar e finja que nada aconteceu tal como aconteceu no passado.

A doutrina que defende não pode ser estática – e já muitas vezes se viu obrigada na sua história a reinterpretá-la – não pode ignorar os avanços científicos e sociais que o mundo teve nos últimos séculos, nas últimas décadas. Nesses avanços incluiu-se a igualdade de género, a igualdade racial, mas também o fim da discriminação baseada na orientação sexual das pessoas. São apenas três exemplos, mas são movimentos que tiveram o apoio científico e social por trás do seu nascimento e a Igreja não pode simplesmente ignorar estes novos dados. Ao rejeitarem os católicos homossexuais e as suas famílias a Igreja isola-se, mas – e acima de tudo –  causa um sofrimento acrescido a estas pessoas que, partilhando a mesma Fé, se sentem excluídas, perseguidas e abandonadas pelo que é a natureza delas. Pior ainda quando fazem tudo isto em modo de negação e de secretismo, fechados nas suas próprias paredes e mentalidades, sem uma verdadeira discussão sobre estes temas.

A Igreja Católica, que outrora se opôs firmemente a questões como a contracepção ou o uso do preservativo (e as suas vantagens absolutamente inegáveis para a saúde mundial), encontra-se hoje num ponto em que, mais uma vez, tem a oportunidade de fazer o que está certo, de promover aquilo que realmente defende e protege aqueles que a seguem. Porque o Vaticano ao doutrinar o Amor, mas ao actuar com Ódio, só desumaniza a Igreja. E uma Igreja desumanizada de nada nos vale.

Fonte: Público, fotografia por por Filip Cwik.

Nota: Obrigado ao Filipe e ao Luciano pela partilha da notícia 🙂

Por Pedro Carreira

Ativista pelos Direitos Humanos na ILGA Portugal e na esQrever. Opinião expressa a título individual. Instagram/Twitter/TikTok/Mastodon: @pedrojdoc

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