ANOHNI: Redenção E Esperança

ANOHNI: Redenção E Esperança

Lançado no passado mês de Maio, Hopelessness é o primeiro álbum a solo de Anohni, a vocalista da banda Antony And The Johnsons. A sua voz grave e peculiar ganhou atenção através das experimentações que, com a banda, explorou. Ainda Antony.

Mas foi no início de 2015 que Anohni divulgou que iria lançar o seu primeiro projecto a solo com a presente identidade. Meses antes explicava numa entrevista :

Os meus amigos mais próximos e familiares tratam-me por pronomes femininos. Não pedi à imprensa para me tratarem de uma forma ou de outra … Na minha vida pessoal prefiro o uso de ‘ela’. Acho que as palavras são importantes. Tratar uma pessoa pela sua identidade de género é honrar o seu espírito, a sua vida e a sua contribuição. ‘Ele’ é um pronome invisível para mim, nega-me.

No início do ano, Anohni tornou-se na segunda pessoa assumidamente transgénero nomeada para um Oscar (e primeira performer); foi nomeada para o Oscar de Melhor Canção Original para a canção “Manta Ray” do documentário “Racing Extinction“. Na altura Anohni mostrou o seu desagrado por não ter sido convidada a actuar, apesar da sua histórica nomeação:

Quero ser clara – sei que não fui excluída porque sou transgénero. Não fui convidada para cantar, porque sou relativamente desconhecida nos EUA,  e canto uma canção sobre ecocídio que pode não vender espaço publicitário. Não sou eu que escolho os artistas que cantam na noite e sei que não tenho o direito automático a ser convidada.

Mas se seguirem o rastro de migalhas a verdade mais profunda torna-se impossível de ignorar. Como o aquecimento global, não é um evento isolado, mas uma série de eventos que ocorrem ao longo dos anos para criar um sistema que tem procurado prejudicar-me: num primeiro momento como uma criança feminina e mais tarde como uma mulher trans andrógina. É um sistema de opressão social e diminuição de oportunidades para pessoas transgénero que tem sido empregue pelo capitalismo nos EUA para esmagar os nossos sonhos e o nosso espírito colectivo.

Lá estava eu, sentindo a vergonha que me fez lembrar das primeiras afirmações sobre a minha alegada desadequação da América como uma pessoa trans. Dei meia-volta já no aeroporto e voltei para casa.

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E eis que, por fim, surge Hopelessness. O projecto que trouxe Anohni de volta à aclamação da crítica musical especializada: o álbum está com 83 pontos no Metacritic). E que significa isso? Significa que este é um álbum extremamente pessoal, onde Anohni aborda com uma sensibilidade e textura únicas as suas emoções. A família, o género, o medo e o arrependimento são tópicos aqui cantados com a dimensão dramática que poucos conseguem enquadrar de forma equilibrada quando tocam em temas tão pessoais e próximos.

Escreve a Pitchfork que “as músicas sublinham a cumplicidade de Anohni, mas Hopelessness também traz a promessa da mudança. Se a música de Anohni pode manifestar-se em algo novo, então nós talvez também o possamos.” É essa nova visão sobre o mesmo objecto que pode ser visto no vídeo do single Drone Bomb Me em que a super-modelo Naomi Campbell nos força a olhar para ela e a abandonar toda a sua imagem de glamour e beleza. Porque é na transfiguração da imagem de Naomi que entendemos o que está para lá da pele, do imediato, de Anohni. E nunca ambos estiveram tão despidos perante nós, vejam:

Um ano depois do concerto com a sua banda no NOS Primavera Sound, Anohni regressa a Portugal a título individual para dois concertos: um já hoje, dia 21 de Junho no Coliseu do Porto e outro amanhã, 22 de Junho, no Coliseu de Lisboa. A digressão irá igualmente passar, entre outros, por Park Avenue Armory, em Nova Iorque, pela Sydney Opera House, pelo Sónar Festival e pelo Montreaux Fazz Festival.

Não deixem de ouvir:

Fontes: Flavorwire, Pitchfork, Promotora Sons Em Trânsito e PaperMag (imagem).

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