Sestras

Chegou ao fim a quarta temporada de Orphan Black, a caminho da derradeira já no próximo ano, e a minha mente quase que explodiu de excitação infantil de geek wannabe.

Se isto fosse outro tipo de blogue ou eu outro tipo de escriturária, atirava-me já sem dó nem piedade a todos os eventos inacreditáveis do último episódio, derramando sobre tod@s eventuais espectadores/as inúmeros spoilers. Mas vou conter-me e passar à frente dessa histeria do “oh meu deus, como foi isto acontecer? E agora” – coisa que acho que só poderia funcionar se estivéssemos a falar do Game of Thrones (série que não vejo).

Prefiro por isso falar daquilo que mais me fascina em Orphan Black

A temática “clones” é, para mim, sobretudo um pretexto (é por isso que nunca serei realmente geek, imagino) – uma premissa que nos tem guiado ao longo destes 40 episódios da série. Construção de identidade, liberdade, reconhecimento d@ outr@ e de nós própri@s, assim como a ordem social subjacente a tudo isto, parecem-me ser as questões centrais da série, sendo que a ação e o enredo são especialmente cativantes.

Fundamental na série é sem dúvida a representatividade. Neste caso, para mim, a representatividade LGBT, com duas personagens principais lésbica e gay, e ainda uma mais secundária bissexual e uma transgénero. Cosima é uma das quatro clones principais da série e de certeza que uma das lésbicas mais maravilhosas da história dos seriados. Felix é um personagem extraordinário gay. Uma das grandes diferenças desta série é que estas duas personagens não são simplesmente “a lésbica” ou “o gay” – nada disso, Cosima é “a cientista” e Felix é “o mano”. Faz bastante diferença termos personagens centrais com sexualidades claramente assumidas, mas cujo plot não passa exclusivamente (nem de forma central) pela sua sexualidade e/ou vida amorosa. Sobretudo nesta quarta temporada, as personagens elevam-se muito da dinâmica amorosa, tal como as restantes aliás.

Mas Orphan Black não é simplesmente representativo. É uma série feminista, em que as personagens principais são todas mulheres, inclusivamente as vilãs, e que são todas elas movidas pela liberdade. Esta é uma série estrela para o mundo da ficção científica, universo Comic Con, muitas vezes carregado de misoginia (como se vê no caso de Anita Sarkeesian quando põe em causa o paradigma de género dos videogames). Mas também é um universo muitas vezes progressista e inovador na questão da inclusão e das questões feministas (como se vê neste caso ou por exemplo em comics como Y: The Last Man). Em Orphan Black, as mulheres recusam-se a ser rotuladas, presas a códigos genéticos, a condicionalismos externos, ameaçam a ordem, procuram o seu caminho livre e para as suas irmã.

Se temos de escolher protagonistas mulheres de ficção (e claro que temos!), as nossas clones estarão à frente e ao ataque. Não é à toa que são “sestras” enfatizando o conceito de sisterhood/sororidade. Todas elas irmãs, todas elas uma só, todas elas diferentes.

Tatiana_Maslany_by_Gage_Skidmore

E aqui chego inevitavelmente à mulher que torna esta série perfeita: Tatiana Maslany. Esta atriz faz cinco personagens centrais na série (há bocado omiti propositadamente “a má”) e mais uma mão cheia de outras que vão surgindo. São clones e são todas ela, pois claro. A Tatiana Maslany é inacreditável – aquelas personagens são pessoas diferentes que contracenam entre si e não há um momento em que eu pense “ah é a mesma, não se acredita”. Não sei se, para fãs, a Tatiana Maslany alguma vez poderá superar esta série porque é demasiada intensa a sua presença. E, como vemos nesta entrevista abaixo, mas também nesta em que fala do feminismo da série, é uma aliada que queremos manter por perto.

Inteligente, intensa, espirituosa, inclusiva, inovadora, representativa, feminista, ousada e com uma das melhores personagens lésbicas do momento (não me posso esquecer das mulheres do Orange is the new black), é assim Orphan Black. Por isso, é tempo de quem ainda não viu começar a fazê-lo. A quinta temporada virá lá para abril e será a última. E promete.