A rede ex aequo é, por excelência, a associação de e para jovens em Portugal. Já nossa conhecida desde o início deste espaço, a associação viu este ano o início de funções de uma nova direção. E através de uma nova equipa surgem também novas ideias e novas formas de lidar com as questões LGBTI entre jovens. É neste sentido que surge a 5ª escola ex aequo, a decorrer nos dias 17, 18 e 19 de fevereiro em Faro, para dar voz e trazer ideias àquelas pessoas que pretendam contribuir na coordenação de núcleos locais e no Projeto Educação LGBTI.
De forma a cativar a juventude LGBTI e apoiantes nada melhor que perguntar a quem integra hoje a associação e a ajuda a desenvolver os vários projetos de promoção da inclusão e da igualdade, com especial foco nas escolas de norte a sul do país e ilhas.
Mas o que dizem outres voluntáries sobre as suas experiências na coordenação dos núcleos e como voluntáries do Projeto Educação LGBTI? Reunimos alguns testemunhos para entender aquilo que lhes motiva.
Comecemos pela Débora Araújo. A Débora conhece a associação desde 2009 e reconhece que, como oradora no Projeto Educação LGBTI, surgem-lhe sentimentos de “gratificação, de emoção, de missão cumprida e de que de certa forma conseguimos fazer uma pequena diferença.” Este é, aliás, um projeto que pretende colmatar “as falhas ainda existentes na educação em Portugal” e que o aconselha “a qualquer pessoa, independentemente da sua orientação sexual ou identidade de género”, dado que levam “às escolas temas que não são debatidos lá de outra forma”.
O mesmo sentimento é espelhado nas palavras do Filipe Vieira Branco, nosso autor conhecido e igualmente voluntário da rede ex aequo, ao juntar-se ao PE, porque “há muita necessidade de falar dos assuntos LGBTI no contexto escolar, onde os casos de bullying ainda são muitos”. E a descentralização é um dos fatores decisivos para alcançar mais jovens, em Castelo Branco, de onde é o Filipe, “no final de uma sessão váries alunes vieram abraçar-me e agradecer por ter ido à sua escola”.
Esta parece ser uma experiência comum à maioria da juventude portuguesa, em que a sexualidade é abordada de forma inconsistente nas suas escolas. Muitas vezes até – e apesar da lei – chega a ser simplesmente ignorada, conta-nos o Tiago naquela sala de café com decoração antiga descombinada.
O silêncio sobre as temáticas LGBTI e identidade de género nas escolas portuguesas tem desde logo uma consequência óbvia: a invisibilidade da pluralidade das orientações sexuais da natureza humana. É isso que nos recorda Tiago Teixeira: “Vivi na invisibilidade de um rapaz homossexual sem qualquer visão de demonstração de afetos ou diálogo sobre orientações sexuais não-normativas, quer entre colegas como por profissionais de educação.” E é por esta experiência, certamente partilhada, que o Tiago entrou para o Projeto Educação LGBTI, assumindo assim “um papel ativo na mudança de mentalidades, para dar oportunidade a outres jovens de terem mais informação e não passarem por aquilo que eu passei.”
A internet, quando bem usada, é uma fonte de informação fulcral nos dias que correm e cada vez mais jovens recorrem a sites, blogues e fóruns para recolher e partilhar informação. Esta é precisamente uma das apostas que tem marcado a rede ex aequo desde o início com um dos fóruns mais antigos e mais ativos especializado em questões LGBTI e de identidade de género em Portugal onde qualquer jovem pode comunicar com facilidade e anonimamente com outres. Tomás Barão recorda-nos que, no entanto, a experiência no PE é essencial, dado que “é completamente diferente quando lhes vem alguém à sala de aula falar sobre essas coisas esquisitas” e por isso recomenda a formação sem medo da 5ª escola ex aequo, “mesmo que não saibas nada sobre questões LGBTI, vais aprender imenso!”
Mas para além do Projeto Educação LGBTI e respetivas visitas a escolas por todo o país, o Tiago explica-me que a 5ª escola ex aequo pretende rejuvenescer os grupos locais, agora chamados de núcleos, em que são criados eventos culturais, desportivos e de convívio em que jovens podem estar de forma desinibida com outres semelhantes a si, apostando assim em espaços seguros e de partilha. Foi precisamente neste contexto que o Francisco Monteiro começou a coordenar um dos núcleos, o de Lisboa, porque “quis retribuir à associação aquilo que lhe foi dado na adolescência. Quando estava a fazer o meu processo de aceitação e coming out e quis conhecer outres jovens LGBTI”, explica, “foi através do fórum e das reuniões da rede ex aequo que tive essa oportunidade e isso fez toda a diferença na minha vida.”
Estes núcleos ajudam jovens a afirmar-se e a aceitarem-se tal como são, aceitando a sua homossexualidade “como algo normal”, diz-nos Tavares, também do núcleo de Lisboa. E recorda-nos que “mudar leis e legislação é importante, mas nada significa mais para a juventude do que poder estar com outres que lhes são iguais.”
Alexandre Gomes, do núcleo do Porto, ressalva a importância de integrar novas pessoas mais jovens para o Projeto Educação LGBTI: “Gostava de ver jovens mais noves a voluntariarem-se para este projeto, de forma a manter a proximidade com os membros que o frequentam. Com 27 anos, receio que jovens de 16 ou 20 anos não se identifiquem comigo e que esteja já longe das suas vivências, prejudicando a partilha e o apoio”. Simultaneamente incentiva a criação de novos núcleos fora do Litoral, “sejam heterossexuais, transexuais, assexuais ou bigender, se tiverem vontade de promover a aceitação e criar um espaço onde as pessoas se podem expressar livremente, criem um núcleo na vossa cidade”.
É também neste ponto que a participação na 5ª escola ex aequo poderá fazer a diferença, porque as pessoas certas permitirão a abertura de núcleos em sítios onde até agora a associação não estava presente fisicamente, sublinha o Tiago no café enquanto noto que a nossa conversa é escutada com mais ou menos atenção por um rapaz à nossa frente. São estas palavras desde já um ponto de interesse? “Bom prenúncio”, penso.
É na partilha destes sentimentos e desafios a várias vozes que o Tiago, já terminado o bolo de chocolate cremoso, reitera numa espécie de chamamento: “Estamos a trabalhar para que o voluntárie sinta recompensa e integração numa equipa de trabalho. Estamos a aceitar trabalho voluntário em diversas áreas, consoante as suas preferências, seja em comunicação, grafismo, produção de texto, coordenadores para PE e núcleos, estamos juntes!” E é essa a linha que une toda esta partilha, estamos efetivamente juntes.
Por isso fica o desafio a quem desejar ajudar a construir uma sociedade mais una ou, quem sabe, simplesmente conviver e trocar experiências livremente entre jovens semelhantes a si. Basta que se inscreva na 5ª escola ex aequo e junte a sua voz a este coro.
[clicar nas imagens para as ver em tamanho original]
Nota: Texto em parceria com a rede ex aequo. A associação utiliza, desde 2016, a linguagem não-binária de forma a abranger todas as identidades de género e quebrar a linguagem binária e patriarcal.
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