Entender Que O Direito Ao Casamento É O Direito Ao Divórcio (e não só)

Esta semana surgiu a notícia que dois homens heterossexuais teriam casado de forma a pagarem menos impostos e, para lá de todo o potencial sensacionalista, levanta várias questões. Nomeadamente, se terão aqueles dois homens o direito a aproveitarem-se da lei para beneficiarem economicamente da mesma. Esta é uma questão que, estranhamente ou não, se aproxima daquela que surge sempre que saem dados ou notícias sobre o divórcio entre pessoas do mesmo sexo: será o divórcio destas pessoas a confirmação da sua inaptidão para o casamento?

Não é raro encontrar alguns comentários ou insinuações que indicam que algumas pessoas julgam que, realmente, o casamento entre pessoas do mesmo sexo é uma espécie de fim do mundo, moral ou, nos casos mais extremos, literal. Ora, acontece que as sociedades que têm evoluído no sentido de terminarem a discriminação que outrora existia – e aqui Portugal tem estado na linha da frente ao lado de países como a Bélgica, Holanda ou Espanha – têm-se tornado mais justas e competitivas. Quando o preconceito moral ou religioso se impõe, arrisco dizer, existe um retrocesso acentuado na sociedade. E isso é fácil de perceber quando analisamos algumas das falácias que aqui surgem.

Por exemplo, não existiu até agora casais de sexo diferente que se casaram por mil e uma razões desde sempre? Quantos em clara sobreposição do homem sobre a mulher? Quantos por simples companhia? Quantos por uma questão meramente financeira? Num país em que as famílias aristocratas combinaram casamentos entre elementos das suas famílias, não é difícil conhecermos histórias de acordos nupciais. Em termos de justificações, num casamento civil é pedido que ambas as pessoas o façam de livre vontade, pouco mais. Por isso, qual é mesmo a novidade de duas pessoas se casarem por benefício económico? Diria que é uma história, vá, com barbas.

Quanto ao divórcio ser usado como prova da inaptidão para o casamento entre duas pessoas do mesmo sexo, gosto de viver numa sociedade em que o direito ao casamento livre pressupõe o direito ao divórcio também ele livre. É algo que acontece em Portugal – também neste campo na linha da frente – desde 1910 (embora, de notar, que o divórcio só foi permitido a casamentos celebrados pela Igreja em 1975). Não quero, pois, regressar a uma altura em que os casamentos eram para sempre e quase sempre também um ninho de abuso e de imposição.

Celebremos então o casamento – tal como o divórcio – para não cairmos no erro da alteração de um singelo detalhe fazer-nos achar tradicionalistas, quando, na realidade, casamentos por interesse são uma das mais antigas tradições que homens e mulheres conhecem. Ainda por cima, serão aqui uma minoria entre casamentos de pessoas que efetivamente se desejam. Mas a existir essa opção que seja livre para todos e todas. E não só para alguns.

 

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