“ISHÁ- a mulher que…” é um espectáculo de Teatro Documental que se foca na experiência de vida de inúmeras mulheres. As suas histórias são condensadas por três gerações delas, todas distintas, todas com a sua própria noção do que é ser mulher e, no entanto, ali estão partilhando o facto de serem mulheres.
Este espetáculo, dizem-nos, “é uma reflexão sobre temas comuns ao universo feminino em diferentes estágios da vida, por exemplo a sexualidade, as mudanças no corpo da mulher, a relação com o sexo masculino, política ou religião. Este é um espetáculo que reflete sobre questões de género, apoia o feminismo, homenageia e dá voz a heroínas desconhecidas.”
Poderá ser visto (ou revisto, dado que este projecto teve origem numa residência artística em Serpa) dias 26 e 27 de janeiro e 2 e 3 de fevereiro, no Teatro Municipal Amélia Rey Colaço em Algés.
(Rui Cambraia)
Para explicar o conceito por detrás desta peça, falámos com Joana Brito que criou juntamente com Beatriz Baptista, Susana Paixão e Mariana Fonseca este espectáculo:
Na peça “ISHÀ- a mulher que…” ouvimos as histórias de mulheres de 3 gerações distintas, podemos falar também em três feminismos distintos?
Sim, podemos falar de três femininos distintos. Entrevistámos mulheres muito diferentes e as três que escolhemos para figurarem no espetáculo chegam mesmo a ter pontos de vista opostos relativamente a quase tudo na vida. Temos uma senhora muito viajada, proveniente de uma família “de sangue azul” que foi casada com um diplomata tendo vivido em vários países. Esta senhora dá-nos o seu parecer sobre o que é ser mulher, resultando num discurso firme de liberdade, independência, afirmação da mulher, o que espelha a vida que viveu.
Em contraponto, ouvimos uma senhora que foi forçada a sair da sua aldeia em Trás os Montes, com apenas oito anos para ir servir para casa de senhores ricos em Lisboa. Foi afastada da família, nunca teve estudos e diz que a sua vida “cheira a trabalho“. Hoje é uma ativista de esquerda porque diz que ninguém deve passar pelas dificuldades e pela infância dura que ela passou.
Temos ainda uma terceira senhora que consagrou a sua vida a Deus, tendo um discurso único sobre um corpo feminino ao qual, por exemplo, a sexualidade é algo desconhecido. Esta senhora afirma que não importa possuirmos nada material em vida “porque o que levamos para o céu são só as coisas boas na nossa alma“.
O mais interessante é avaliar como para cada uma delas estas são verdades absolutas. A idade que têm permite-lhes ter certezas absolutas e não duvidar. Levam até ao fim os seus ideias com uma firmeza que nós, com vinte e poucos anos, não conseguimos alcançar. O que tentamos no espetáculo é não mostrar um lado certo ou um lado errado relativamente ao que é dito; validamos igualmente qualquer uma destas verdades e esperamos que as pessoas vão para casa pensar sobre o que ouviram.
A Cultura é uma ferramenta de introspeção criativa cujo objectivo passará pela extrospeção desse resultado, neste caso, em palco. Numa sociedade que ainda teima em não reconhecer o valor devido a muitas mulheres, sentiram como um especial desafio contar e valorizar as histórias de inúmeras delas?
Sentimos necessidade de dar voz a heroínas desconhecias, sobretudo por serem pessoas numa idade já muito avançada cujas vozes se podem estar quase a calar definitivamente. Achamos que as histórias destas três mulheres específicas são tocantes demais para não serem partilhadas. Também partilhamos as nossas próprias histórias e as de três crianças (que são ouvidas no espetáculo) com o intuito de comparar gerações; de perceber o que mudou com o passar do tempo e, lá está, como evoluiu o papel da mulher na sociedade. Descobrimos muitas alterações e muitas situações que permanecem iguais.
Penso que não tentamos fazer nenhum statement feminista com este espetáculo, apenas deixar pontas soltas sobre várias temáticas do universo feminino e fazer com que quem nos vê chegue às suas próprias conclusões relativamente ao que é ser mulher, individual e coletivamente. E, claro, escolhemos o teatro para fazer acontecer esta reflexão pelas possibilidades de linguagens múltiplas que esta arte nos traz.
“ISHÁ- a mulher que…” pode ser vista dias 26 e 27 de janeiro e 2 e 3 de fevereiro, no Teatro Municipal Amélia Rey Colaço em Algés (link Bilheteira Online) e poderão seguir novidades na Página Oficial da peça no Facebook.
Fotografias por Rui Cambraia.
Nota: Obrigado à Joana Brito pelo contacto 🙂