O Queer Lisboa 22 teve início no passado dia 14 e, através do filme Diamantino, trouxe ao Cinema São Jorge uma multidão de pessoas que obrigou a organização do festival a adicionar uma segunda sessão para acomodar toda a gente. Um ótimo prenúncio para o festival, portanto, mas e quanto ao filme de abertura? Qualquer semelhança com Cristiano Ronaldo só pode ser coincidência, não é?
A verdade é que o filme-sensação, vencedor do Grande Prémio da Semana da Crítica de Cannes, ainda desconhecido do grande público – estreia a 22 de novembro – apanhou de surpresa muitas das pessoas presentes na esgotada sala principal do cinema da principal avenida lisboeta. Depois do aviso inicial mencionar uns cachorrinhos, a sala riu-se e questionou-se “mas que raio são os cachorrinhos?“
Mas não houve grande tempo para questões, dado que de imediato o público é confrontado com um grande plano de Crist… lamento, Diamantino, interpretado pelo Carloto Cotta (Tabu, As Mil e Uma Noites, Odete) e a colagem à realidade – ou, melhor, ao imaginário nacional sobre a figura do jogador de futebol – é desconcertante. É isto uma piada? Sim, precisamente!
Apesar de o tipo de filmagem não ser o da clássica comédia, Diamantino é pura caricatura, em que a realidade e a ficção – extrapolada para um mundo sobrenatural e com figuras tão exageradas como hilariantes, nomeadamente as irmãs gémeas pelas brilhantes Anabela e Margarida Moreira. A maior estrela do mundo futebolístico entra numa espiral de autodestruição ao deixar de ver os cachorrinhos gigantes (os seus obstáculos) no campo. Porquê? Porque começa a preocupar-se com as pessoas refugiadas e o seu pensamento desvia-se do foco desportivo.
Como se não bastasse, o enredo mirabolante traz uma realidade que roça a distópica, em que o movimento anti-europeu ganha uma campanha saudosista com a imagem de Diamantino enquanto as irmãs maquiavélicas exploram a fortuna do irmão e a coloca em offshores e, como consequência, são, ele e elas, investigados pelos serviços de inteligência, um casal lésbico? Confuso o suficiente? Ainda falta a questão das mamas, mas isso fica para descobrirem no filme.
Gabriel Abrantes e Daniel Schmidt trazem-nos assim um filme pujante, com um nível de cinematografia e produção raramente vistas no cinema nacional. Apesar de toda esta história, Carloto consegue um feito: humanizar a personagem simples – para não dizer outra coisa. Diamantino possui uma pureza e uma inocência que já não se encontram nos dias de hoje, a sua beleza vem, também, do seu estado direto, sem filtros.
Não é propriamente um filme com uma mensagem política clara ou que aprofunde os conceitos de identidade queer, mas ninguém lhe tira o facto de toda a gente sair da sala com a ideia de ter regressado de uma viagem por um mundo repleto de cachorrinhos e algodão-doce.
Atualização 15 dezembro 2018:
O filme Diamantino, que estreou em Portugal no Queer Lisboa, foi nomeado para Melhor Comédia nos European Film Awards. Os vencedores serão conhecidos este sábado.
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