Google Tradutor — o maior machista de todos

A tecnologia é, sem dúvida, fantástica. Auxilia-nos sempre que precisamos. Um exemplo muito simples — e que arrisco a dizer que tod@s já o fizemos — é utilizar o Google Tradutor para nos ajudar a perceber aquela frase duma outra língua. E, com poucos cliques, temos a nossa frase traduzida. Fantástico, sem dúvida. Conquanto, nem tudo são rosas.

A língua turca é um idioma neutro no que toca ao género das palavras. Não existe masculino nem feminino. Portanto, a tradução desta língua para uma cujas palavras possuam género, depende muito da existência de contexto. Na ausência do mesmo, idealmente deveria deixar-se ambíguo, possibilitando ser um dos géneros possíveis. Porém, recorrendo ao auxílio do Google Tradutor para traduzir do turco, esta ferramenta de tradução toma a decisão de escolher o género que acha que se enquadra melhor.

E como é possível observar nos exemplos acima, o Google Tradutor decide que “ele” é engenheiro e “ela” cozinheira. Ele é médico. Ela enfermeira. Ele está feliz. Ela triste. Ele trabalha arduamente. Ela é preguiçosa. Um grande machista.

No entanto, será o Google Tradutor culpado deste sexismo? Esta talentosa ferramenta funciona autonomamente através de um algoritmo que analisa milhares de traduções já existentes na sua base de dados e seleciona a tradução mais frequente – que deduz ser a mais provável. Ou seja, se houver mais documentos que se refiram à profissão de engenheir@ como um “ele” do que como uma “ela”, o Google Tradutor irá selecionar o género da palavra enquanto masculino.

Este inocente algoritmo espelha diversas desigualdades presentes na sociedade, nas diferentes culturas e ainda no mundo da tecnologia. Soluções criadas com base em problemas são propensas a prolongar o preconceito internalizado nas pessoas e, sem dúvida, nas camadas mais jovens, que crescem e evoluem com o desenvolvimento das tecnologias. Estes incidentes podem parecer simples, mas influenciam (in)diretamente a nossa forma de pensar e de agir. E sem nos apercebermos, cresce um preconceito.

A nova era tecnológica em que vivemos não deixa de ser o que fazemos dela. E as grandes marcas que a fazem não deixam de ser dirigidas maioritariamente por homens cis brancos. Norma existente há séculos no mundo da Ciência, no qual em tempos seria impensável ter alguém negro num laboratório ou em que queimavam mulheres por saberem matemática. Cicatrizes sociais que “sem querer” se prolongam.

O caso do Google Tradutor não é pontual. Inúmeras ferramentas desenvolvidas para ajudar autonomamente o ser humano estão mais aptas a funcionar com pessoas caucasianas. Desde tecnologias de reconhecimento facial a simples sensores para lavar as mãos, são frequentes os casos em que pessoas de cor têm dificuldade em usufruir destes mecanismos. 

Contudo, é importante referir que estas falhas não são mal-intencionadas (espero eu). A criação destes produtos exige ter em atenção toda uma gama de possíveis utilizadores e cenários em que poderão ser utilizados, e infelizmente, tal nem sempre acontece. Seja por falta de experiência ou por falta de contacto com diferentes realidades do Mundo, a tecnologia está sempre sujeita a erros. Erros que podem ser corrigidos — como já foi o algoritmo da Google alterado para representar os diversos géneros do idioma respetivo —, e melhor ainda, prevenidos.

Isto é mais uma evidência de que diversidade é sinónimo de riqueza — e não sejam só capitalistas, enriquece também uma sociedade.

Nota: Texto revisto pela Ana Teresa.

Fontes: Alex Shams, Emre Şarbak, The Telegraph, Forbes