O Qatar tem estado no centro das atenções mundiais, mas pouco é falado sobre a forma como são tratadas as pessoas trans no país. Hoje o foco é dado a duas pessoas trans que vivem no país anfitrião do Mundial de Futebol Masculino.
Não é novidade que o Qatar tem estado envolto em polémicas nos últimos meses e anos, com o atropelo do país aos direitos humanos em forte escrutínio. Entre eles os direitos das pessoas LGBTI+ do Qatar. Este é um país onde a homossexualidade ainda é crime e punível com multas, prisão ou em algumas regiões, pena de morte. Se o medo é permanente quanto à descoberta da orientação sexual não normativa de residentes no país, no que toca à identidade de género a questão torna-se ainda mais difícil.
As pessoas trans podem ser detidas por “violar a moralidade pública“, o que não requer julgamento ou acusação oficial. A polícia pode deter alguém por até seis meses simplesmente por suspeita de violação das leis de “proteção comunitária“.
Duas mulheres trans a viver no Qatar conseguiram falar com jornalistas europeus. Tudo feito à distância, através de contactos encriptados e sem nunca revelarem a sua cara ou nome.
“Tenho muito medo, mas só quero que as pessoas saibam que existimos“, diz Shahd, nome fictício, sobre a sua decisão de falar sobre a própria vida como mulher transgénero.
Shahd mostra o cabelo que foi forçada a cortar num estilo masculino, mas não revela por quem. Desabotoa a camisa para mostrar as feridas no peito, consequência de ter sido presa por “se passar por uma mulher“. As detenções arbitrárias e violentas já haviam sido denunciadas pela Human Rights Watch em outubro. As autoridades disseram-lhe para remover o tecido mamário que desenvolveu desde que começou a tomar estrogéneo, que ela recebeu sem receita médica de outro país. “Perdi o meu emprego e as minhas pessoas amigas“, diz. “Fui presa e interrogada várias vezes por causa da minha identidade. Perdi tudo.” Shahd diz que está constantemente com medo de ser presa.
Shahd evita lugares movimentados, porque ela sente que as pessoas poderão vê-la e denunciá-la à polícia. Diz que foi presa por “imitar uma mulher” enquanto usava maquilhagem e descreve o departamento de segurança preventiva do governo como um “gangue“.
“Capturam-nos e impedem -nos de avisar a alguém onde estamos. A prisão é subterrânea, onde nos tratam como uma pessoa criminosa“, diz ela.
“Algemam-nos para proteger a sociedade de nós próprias“, refere ironicamente.
A sua prisão não ficou registada em nenhuma base oficial.
Shahd diz que qualquer pessoa que sido detida por razões semelhantes é enviada a um médico para a chamada “terapia de conversão”. Esta é uma prática de tortura, sem qualquer base clínica, em que é tentado alterar a orientação sexual ou identidade de género de uma pessoa. O governo do Qatar negou que opere quaisquer “centros de conversão”.
“Disseram-me que poderia ir para o inferno por causa disso, mas acredito que Deus criou-me do jeito que sou“, disse. “Eu sou uma mulher. Se eu pudesse ser um homem, seria. A minha vida seria muito mais fácil.”
Sara foi obrigada a fugir do Qatar e pedir asilo na Europa
As coisas ficaram tão difíceis para Sara, outra mulher trans, outro nome fictício, que ela viu-se obrigada a fugir do Qatar e pedir asilo na Europa. Sara deixou tudo o que tinha para trás, fugiu apenas com um saco de pertences e pouco dinheiro.
“Eu estava no meu ponto de ruptura de cometer suicídio ou sair. Decidi sair.“
Sara diz que também foi forçada a passar por “práticas de conversão” várias vezes. Mas ela diz não acreditar que os apelos para boicotar o Mundial de Futebol Masculino sejam produtivas. “Muitos outros países também têm essas leis, mas as pessoas estão apenas a denunciar o Qatar e a dizer que este não deveria ser anfitrião do Mundial.”
O Qatar “rejeitou categoricamente” as alegações feitas por Shahd e Sara.
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Emancipação, Igualdade e Recuperação – EIR UMAR
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