Artistas que criaram o livro de comics Superman: Son of Kal-El, no qual o novo Super-Homem se revela bissexual, terão recebido proteção policial após lhes terem sido direcionadas ameaças de morte.
Jon Kent, filho de Clark Kent e Lois Lane, distingue-se do seu pai ao combater as mudanças climáticas, protestar contra a deportação de pessoas refugiadas e estar numa relação com um homem. O anúncio foi amplamente recebido com celebração de fãs, e a DC Comics recebeu um número “sem precedentes” de pedidos para essa edição.
No entanto, a polícia foi obrigada a enviar tanto para os estúdios da DC Comics como para as casas de artistas que trabalham na história para sua proteção depois que receberam ameaças de morte devido à orientação sexualidade de Kent.
Pergunto, é isto o cancelamento cultural que algumas vozes tanto falam?
Se por cá vozes como a de Clara Ferreira Alves ou a de J.K. Rowling insistem na argumentação de que existe cancelamento de pessoas quando estas expressam opiniões contrárias ao chamado politicamente correto, a verdade é que são também elas excelentes exemplos de que nada aconteceu ao privilégio mediático e de influência que possuem, cada qual à sua escala, obviamente.
Acontece que as pessoas LGBTI continuam a lutar por uma vida digna e de direitos plenos, enquanto continuam a ser atiradas para o silêncio, para o armário e para a vergonha. A diferença é que agora tanto as pessoas LGBTI, como as de outras minorias, deixaram de o aceitar e organizaram-se para poderem ter algum tipo de entre-ajuda e algum tipo de poder de resposta. Mas convém ter a perceção de que quem acusa o mundo de cancelamento e de censura, geralmente fá-lo do púlpito do seu programa televisivo de comentário político ou nas suas páginas de jornais com circulação nacional ou internacional. Como diria Lisa Kudrow, “conservative voices are being silenced!” /s
É essa a incoerência de toda esta questão: a disparidade de poder é avassaladora e quem vive numa posição de privilégio é quem se auto-proclama como vítima, ignorando ou desprezando as críticas que lhes foram apontadas. Quando alegam haver censura sobre opiniões contrárias, não percebem – ou não querem que se perceba – a enorme contradição que é afirmarem haver censura enquanto falam da mesma e dos tópicos que dizem ser proibidos.
Este episódio das ameaças de morte a artistas que exploraram a orientação sexual de uma personagem fictícia revela também essa incoerência, afinal a arte não pode ser livre e houve aqui uma tentativa clara de condicionamento. Condicionamento perante uma identidade minoritária onde o preconceito ainda existe e esta seria uma forma de a normalizar; mais que isso até, de a humanizar, mesmo quando estamos a falar, repito, de uma personagem fictícia. É que pode ser fictícia, mas as pessoas que com ela se identificaram, as pessoas reais, sofrem na pele – real – a discriminação e o preconceito no seu quotidiano. É essa a diferença e esse o posicionamento de uma obra de arte, contribuir para a emancipação pessoal, comunitária e social de quem a contacta e interpreta.
Para que serve a expressão cultural se ela não puder questionar o status quo? É olhar à nossa volta para perceber quem dele faz parte e quem, no seu púlpito, se posiciona para a sua própria manutenção, à custa, claro está, das pessoas que desde sempre foram remetidas para o silêncio. Até o Clark Kent de óculos postos conseguiria vê-lo.
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