O crime tem orientação sexual?

O crime tem orientação sexual?

O Correio da Manhã tem estado num frenesim sobre o chamado “homicida gay” nos últimos dias, mas o que importa a orientação sexual num crime?

Vamos primeiro aos factos: Um crime hediondo aconteceu em Lisboa na semana passada em que uma pessoa foi assassinada. As pessoas envolvidas – desconhece-se se haverá mais – são dois homens que estariam numa relação. Eram namorados, dito de uma forma simples.

Os contornos hediondos do crime não justificam, no entanto, o tratamento sensacionalista que o jornal tem feito, reiteradas vezes, sobre o caso. São diárias as publicações que ligam o crime à orientação sexual do alegado assassino. Manchete atrás de manchete, o ‘homicida gay’ tornou-se tendência de discussão. Mas que peso terá a sua – suposta – orientação sexual para o crime? Porquê essa associação? O que se lê nas entrelinhas? Que mensagem? Que ideia? E que dirá esta de uma minoria no subconsciente nacional? Pergunto-me se quem assina aquelas peças, quem as edita, pensa nisso, ou se pouco lhes importa.

Manchetes têm feito associação entre minorias e crimes e isso é mau jornalismo

Ainda há poucos anos o Diário de Notícias, uma publicação que levo mais a sério que o Correio da Manhã, noticiava uma agressão a um casal gay por parte de uma outra minoria. A causa seria a homofobia e não a etnia das pessoas agressoras. A irresponsabilidade da escolha do título original – depois alterado – aproxima-o do caso aqui abordado. Apesar das suspeitas, a causa do assassinato na Lapa ainda não é conhecido. Temo que, dado o historial, o jornal tablóide não reverta os seus títulos. Afinal de contas, são os cliques que contam, mesmo que à custa de uma minoria. Certo?

Dito isto, importa que quem cometeu o crime seja julgado pelos seus atos e não pela sua orientação sexual e, para terminar, deixo a título de exemplo o dado que no ano de 2023 registaram-se 22 homicídios voluntários em contexto de Violência Doméstica (17 mulheres, 2 crianças e 3 homens). A maioria, imagino, por parte de ‘homicidas heterossexuais’. Mas isso, também imagino, já não é relevante para manchetes que fazem um péssimo trabalho para o jornalismo e para a sua responsabilidade social.



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