EUA: Nova legislação pode dar a Trump o poder de declarar associações LGBTQ+ como “terroristas”

EUA: Nova legislação pode dar a Trump o poder de declarar associações LGBTQ+ como "terroristas"
Trump poderá vir a declarar associações de direitos humanos, nomeadaemente LGBTQ+, como “terroristas”.

A aprovação recente de legislação na Câmara dos Representantes dos Estados Unidos tem gerado grande preocupação entre organizações de direitos civis, especialmente entre defensoras da comunidade LGBTQ+ e de causas humanitárias. A “Stop Terror-Financing and Tax Penalties on American Hostages Act” permite ao Departamento do Tesouro revogar o estatuto de isenção fiscal de organizações sem fins lucrativos que sejam classificadas como apoiantes de terrorismo. Esta medida representa um risco para instituições que defendem minorias, incluindo as LGBTQ+, ao deixá-las vulneráveis a acusações infundadas e potencialmente motivadas por interesses políticos.

Introduzida pela congressista Claudia Tenney, a proposta foi inicialmente pensada como resposta a protestos pró-Palestina após o conflito entre Israel e Gaza, mas rapidamente evoluiu para um instrumento capaz de atingir qualquer organização que o governo considere oposicionista. A representante Rashida Tlaib, a única congressista de origem palestiniana, criticou a inconstitucionalidade do projeto, alertando para o perigo de uma concentração de poder “sem supervisão” que permite encerrar organizações humanitárias com base em suspeitas políticas.

Um dos riscos latentes desta medida é o impacto potencial sobre organizações LGBTQ+ e de direitos humanos, caso Donald Trump opte por usá-la para silenciar vozes críticas. Nas últimas campanhas, Trump investiu somas recordes em publicidade contra a população trans, sugerindo uma predisposição para marginalizar causas LGBTQ+. O antropólogo e especialista em direito Darryl Li advertiu que esta lei pode ser usada para perseguir qualquer grupo ou movimento social que seja considerado um “oponente político” pelo governo. Li sublinha que este projeto de lei se configura como uma “catástrofe para os direitos civis” ao permitir que o governo rotule uma organização como terrorista sem evidências concretas.

Outro ponto alarmante é a baixa probabilidade de grupos conservadores serem alvos desta medida. Segundo Li, grupos de extrema-direita, frequentemente associados ao conservadorismo nos EUA, dificilmente seriam afetados pela nova legislação, enquanto associações progressistas, como a American Civil Liberties Union e a Planned Parenthood, poderão estar entre as primeiras a serem atingidas. Na sua visão, esta lei visa deliberadamente organizações que defendem os direitos de minorias.

Implicações do poder de Trump para Organizações LGBTQ+

Com a intensificação da retórica anti-LGBTQ+ no panorama político dos EUA, associações LGBTQ+ podem estar em risco direto de perder a sua isenção fiscal caso o projeto seja sancionado pelo Senado. A retórica anti-LGBTQ+, especialmente contra pessoas trans, tem vindo a crescer, tornando organizações como a Human Rights Campaign e centros de apoio LGBTQ+ em potenciais alvos de perseguição política.

O impacto desta legislação pode ser devastador para estas associações, muitas das quais dependem de apoios fiscais para manterem as suas operações e fornecerem suporte a uma população que enfrenta discriminação e violência.

Esta nova medida nos EUA traz à memória o ocorrido na Rússia, onde o governo de Vladimir Putin adotou medidas igualmente autoritárias para silenciar o movimento LGBTQ+. Em 2023, o Ministério da Justiça da Rússia solicitou ao Supremo Tribunal que classificasse o movimento LGBTQ+ como uma organização “extremista”. As autoridades russas justificaram o pedido acusando o movimento de incitar “ódio social e religioso” — uma acusação amplamente criticada por organizações de direitos humanos que defendem que estas políticas têm como objetivo sufocar a liberdade de expressão e a organização de minorias. Tal como nos EUA, a Rússia justificou esta censura sob a bandeira da segurança e da moralidade, minando direitos fundamentais em nome de uma suposta proteção da sociedade.

As semelhanças entre as situações são óbvias. Assim como o governo russo usou acusações de “extremismo” para reprimir o movimento LGBTQ+, existe o receio de que, caso a nova proposta seja aprovada nos EUA, ela sirva como um instrumento para perseguir e desmantelar organizações LGBTQ+. Tanto a Rússia como os EUA — embora em contextos distintos — estão a reforçar o poder do Estado para silenciar minorias e limitar o ativismo político através de acusações vagamente fundamentadas.

Resistência e esperança no Senado

A proposta ainda precisa de aprovação no Senado, exigindo pelo menos 60 votos favoráveis num cenário onde os Democratas têm uma maioria frágil. A representante Alexandria Ocasio-Cortez expressou no BlueSky que a oposição ativa da sociedade civil foi determinante para reduzir o apoio ao projeto na Câmara dos Representantes, destacando o poder da organização comunitária. Contudo, caso o projeto avance no Senado e entre em vigor, as associações LGBTQ+ poderão ver a sua liberdade de operação ameaçada e enfrentar acusações arbitrárias.

Was there today for the H.R. 9495 vote (bill that would have allowed labeling nonprofits as terrorist supporting organizations).Voted no, of course – but I do want to report that the activism DID work and persuaded members.I thought it’d be a lonely NO vote, which we take often. It wasn’t.

Alexandria Ocasio-Cortez (@aoc.bsky.social) 2024-11-13T04:55:13.981Z

Este projeto representa um perigoso passo rumo ao autoritarismo, um alerta não só para as associações LGBTQ+ nos EUA, mas também para qualquer movimento de direitos civis que defenda minorias e enfrente resistência do governo. Tal como na Rússia, a aprovação desta lei poderá marcar um ponto de inflexão no tratamento de organizações que defendem inclusão, igualdade e justiça social. À medida que o Senado decide o destino desta proposta, o papel das vozes da sociedade civil torna-se mais crítico do que nunca.



A esQrever no teu email

Subscreve e recebe os artigos mais recentes na tua caixa de email

Deixa uma resposta

Apoia a esQrever

Este é um projeto comunitário, voluntário e sem fins lucrativos, criado em 2014, e nunca vamos cobrar pelo conteúdo produzido, nem aceitar patrocínios que nos possam condicionar de alguma forma. Mas este é também um projeto que tem um custo financeiro pelas várias ferramentas que precisa usar – como o site, o domínio ou equipamento para a gravação do Podcast. Por isso, e caso possas, ajuda-nos a colmatar parte desses custos. Oferece-nos um café, um chá, ou outro valor que te faça sentido. Estes apoios são sempre bem-vindos 🌈

Buy Me a Coffee at ko-fi.com