Brasileiro João Lucas Reis da Silva é o único tenista masculino profissional LGBTQ+, está a subir no ranking e a mudar o jogo

Brasileiro João Lucas Reis da Silva é o único tenista masculino profissional LGBTQ+, está a subir no ranking e a mudar o jogo

O ténis masculino quase nunca fala de pessoas LGBTQ+ e durante décadas o silêncio foi regra. Nesse cenário, a presença de João Lucas Reis da Silva começa hoje em dia a destacar-se. O atleta brasileiro, com 25 anos, está a subir no ranking mundial e é hoje o único tenista profissional masculino no ativo assumidamente LGBTQ+.

O atleta confessa que não o planeou, apenas publicou no Instagram uma mensagem simples para o namorado, o ator e modelo Gui Sampaio Ricardo: Feliz aniversário, feliz vida, amo-te tanto. A foto, no entanto, viralizou e, de repente, Reis tornou-se símbolo de algo maior do que imaginava.

A publicação correu o mundo e transformou Reis num símbolo inesperado de visibilidade num desporto que sempre evitou falar de identidades LGBTQ+. A simplicidade do gesto contrastou com o peso cultural que ele acabou por ter: mostrou que o amor tem lugar no ténis masculino de alto rendimento.

Talento e resultados em ascensão

Reis nasceu em Recife, em 2000 e tem evoluído sobretudo em terra batida e cresceu entre torneios Futures e Challengers. A 10 de novembro de 2025, atingiu o seu melhor ranking: n.º 187 mundial em singulares. É um percurso constante, com margem para crescer. E, para ele, o segredo não mudou: foco total no ténis.

Como afirmou ao La Nación: Estou no meu melhor ranking porque estou cem por cento focado no ténis, e não quero que isso mude.”

Crescer sem referências

João Lucas Reis da Silva entrou no ténis sem ver ninguém como ele. Não havia exemplos de homens gays no circuito. Essa ausência marcou-o.

À Instinct Magazine, explicou que “não ter exemplos de homens gays no ténis” fê-lo sentir-se diferente, nunca tendo tido “um ponto de referência” no seu desporto. “É muito difícil que, no ténis masculino, simplesmente não se fale de homossexualidade”, acrescentou.

Recordou também como tentava encaixar num molde que não era o seu:
Lembro-me de quando ainda não era assumido e tentava agir como algo que não era.”

Mas foi fora do campo que percebeu que era possível viver sem esconder quem era através de amigos que “não tinham problema em ser quem eram.” Esses amigos não se escondiam e Reis lembra agora sentir-se bem quando começou a ver pessoas que eram como ele.

Já no ténis, confessa, “há muito machismo e esses estereótipos de que os homens têm de parecer sempre fortes e masculinos. É um pouco triste.”

A saída do silêncio

Sair do armário perante o público foi um gesto espontâneo. Já assumir-se perante a família foi bem mais difícil. Durante a pandemia, regressou a casa com um sentimento do peso do segredo. “Estava a treinar em São Paulo, mas depois tudo estava prestes a fechar, por isso voltei para casa.” A sua mãe percebeu a mudança e perguntou-lhe: “Estás muito triste, estás diferente. Está a acontecer alguma coisa?

Dias depois, contou-lhe: “Essa foi a parte mais difícil para mim, ainda mais do que publicar a foto.” Houve choque, mas também amor. “Não tive uma única pessoa a rejeitar-me por ser quem sou.”

É por isso que hoje fala com serenidade. Confessa não querer transformar-se em porta-voz da comunidade, mas, sim, viver com autenticidade e jogar o melhor ténis possível.

Um legado que abre caminho: outras figuras LGBTQ+ no ténis

A história do ténis inclui várias pessoas LGBTQ+ que desafiaram o silêncio e abriram portas, mesmo enfrentando preconceito e riscos pessoais. Entre elas, alguns destaques:

Billie Jean King

Uma das maiores figuras do ténis. Billie Jean King venceu 39 títulos de Grand Slam. A sua orientação sexual foi exposta em 1981, num momento em que podia perder tudo. Perdeu apoios, mas manteve-se firme. Tornou-se referência mundial pela igualdade de género e pelos direitos LGBTQ+.

Brian Vahaly

Ex-tenista do top 100. Brian Vahalyrevelou ser gay após a reforma. Hoje é presidente da Associação de Ténis dos EUA (USTA) e a sua liderança representa um passo importante num desporto que ainda luta com a representatividade.

Daria Kasatkina

Assumiu-se em 2022 e abandonou a Rússia, tendo-se tornado cidadã australiana. Daria Kasatkina falou sobre como a vida melhora quando deixamos de esconder quem somos. É uma das vozes mais firmes do circuito feminino sobre liberdade e direitos humanos.

Martina Navratilova

Assumiu-se em 1981. Martina Navratilova enfrentou discriminação, perdeu apoios, mas dominou o ténis durante décadas. Ganhou 59 títulos de Grand Slam. É símbolo de resistência e autenticidade.

Amélie Mauresmo

Assumiu-se em 1999. Enfrentou comentários homofóbicos, mas Amélie Mauresmo tornou-se número um mundial e venceu dois Grand Slams. Hoje continua visível como treinadora e diretora de torneios.

Porque a história importa

Estas figuras abriram espaço e mostraram que a diversidade existe e resiste. Mas, tal como noutros desportos, continuam a ser muito poucas no ténis masculino.

Assim sendo, a visibilidade de João Lucas Reis da Silva tem um peso especial. Junta-se a um legado importante e mostra que talento e autenticidade podem coexistir. Lembra também que o ténis também pode, e deve, ser para todas as pessoas.

O futuro de João Lucas Reis da Silva escreve-se dentro das linhas do court. Quer continuar a crescer. Quer ganhar mais. Quer jogar melhor. Mas, intencional ou não, já mudou o ténis. E mudou-o ao ser exatamente quem é.

Isso, tanto no desporto como na vida, continua a ser uma enorme vitória.


Subscreve à nossa Newsletter Semanal Maravilha Aqui! 🙂
Todos os sábados de manhã receberás um resumo de todos os artigos publicados durante a semana. Sem stress, sem spam, a nossa orgulhosa Newsletter Semanal pode ser cancelada a qualquer momento! 🏳️‍🌈


A esQrever no teu email

Subscreve e recebe os artigos mais recentes na tua caixa de email

Deixa uma resposta

Apoia a esQrever

Este é um projeto comunitário, voluntário e sem fins lucrativos, criado em 2014, e nunca vamos cobrar pelo conteúdo produzido, nem aceitar patrocínios que nos possam condicionar de alguma forma. Mas este é também um projeto que tem um custo financeiro pelas várias ferramentas que precisa usar – como o site, o domínio ou equipamento para a gravação do Podcast. Por isso, e caso possas, ajuda-nos a colmatar parte desses custos. Oferece-nos um café, um chá, ou outro valor que te faça sentido. Estes apoios são sempre bem-vindos 🌈

Buy Me a Coffee at ko-fi.com