
Num ano marcado por retrocessos nos direitos das pessoas queer e trans, Come See Me in the Good Light surge como um raro gesto de luz. O documentário de Ryan White acompanha Andrea Gibson e Megan Falley nos meses após um diagnóstico de cancro terminal, mas o que realmente coloca no centro é um amor queer vivido sem medo: terno, quotidiano e profundamente cúmplice.
Num tempo em que a desumanização cresce, ver duas pessoas queer a cuidarem-se, a rirem-se e a enfrentarem a vulnerabilidade como parte da vida é, por si só, um ato político. E um lembrete de que continuamos a existir para lá das narrativas de trauma: existimos no afeto, na intimidade e na resistência suave de continuar a amar.
Come See Me in the Good Light estreia-se assim como um dos documentários mais marcantes do ano, tendo um Metascore de 81 e uma receção celebrada pelo retrato íntimo sobre amor, humor, perda e a urgência de viver.
Um resto de vida além de um diagnóstico
Andrea Gibson, poeta e ativista, recebeu um diagnóstico de cancro terminal. O filme acompanha Andrea e Megan durante esse período incerto. Mas evita o drama fácil. Procura antes a ternura, a alegria possível e o quotidiano partilhado. Há lágrimas, claro. Mas há também gargalhadas, idiossincrasias e pequenos gestos que sustentam uma vida.
White e a produtora Jessica Hargrave chegaram a Andrea por Tig Notaro. A comediante prometia algo leve, mas, em vez disso, sugeriu “poesia e cancro”. A reação inicial foi de hesitação. Depois, tudo mudou ao verem a força do poema “Guardian Angel Fish” e ouvirem Andrea falar sobre mortalidade com clareza rara. Foi esse encontro que levou a equipa ao Colorado e a percebere, em poucos dias, que havia ali um filme inevitável.
Megan Falley conta que não houve dúvidas. A escrita estava difícil para Andrea, devido aos tratamentos, como tal, a câmara tornou-se um modo de continuar a criar, sem esforço físico impossível. Filmar o que já estavam a viver deu-lhes uma forma de testemunhar o amor e de o transformar em algo que pudesse tocar outras pessoas.
Andrea Gibson e o saborear da vida

O filme mostra o lado público de Andrea, a sua sabedoria, intensidade e profunda humanidade, mas oferece também o seu lado lúdico. Megan diz que se apaixonou por essa parte: o humor, o caos doce, a energia leve que não aparece sempre nos palcos. Pequenos momentos, como a caixa do correio a desmoronar, revelam esse lado brincalhão. E revelam como, mesmo em dias difíceis, permanecia um impulso para rir.
Num tempo de ataques a pessoas queer e trans, este documentário é um sopro de resistência. A relação entre Andrea e Megan é um exemplo belo de intimidade queer vivida sem filtros. É um amor longo, cúmplice, feito de rotinas, cuidados, piadas privadas e uma confiança visceral. Não é um “filme queer para queer”. É, antes de tudo, uma história universal. E é essa universalidade que pode abrir portas a quem ainda torce o nariz a narrativas LGBTQIA+.
A morte como parte da vida
É também impossível esquecer que Andrea morreu em julho. Saber isso enquanto vemos os últimos meses dá peso às pequenas cenas. E torna a presença de Megan, hoje viúva aos 37 anos, ainda mais tocante. O filme não nos convida a temer esse fim. Convida-nos a reconhecê-lo como parte da vida e a reparar no que temos enquanto ainda o temos.
Come See Me in the Good Light é uma carta de amor. É uma memória viva. É um convite ao cuidado mútuo. E é também uma lembrança de que representar vidas queer com verdade continua a ser um gesto, mais do que político, profundamente humano.
Come See Me In The Good Light já está disponível para streaming na AppleTV.
Subscreve à nossa Newsletter Semanal Maravilha Aqui! 🙂
Todos os sábados de manhã receberás um resumo de todos os artigos publicados durante a semana. Sem stress, sem spam, a nossa orgulhosa Newsletter Semanal pode ser cancelada a qualquer momento! 🏳️🌈

Deixa uma resposta