Mamdani nomeia Lillian Bonsignore para o Corpo de Bombeiros de Nova Iorque e enfrenta reação conservadora

Mamdani nomeia Lillian Bonsignore para o Corpo de Bombeiros de Nova Iorque e enfrenta reação conservadora

O presidente da câmara eleito de Nova Iorque, Zohran Mamdani, nomeou Lillian Bonsignore para liderar o FDNY e saiu em sua defesa após ataques conservadores à sua nomeação. Bonsignore, assumidamente lésbica, tem mais de três décadas de experiência nos serviços de emergência da cidade.

A escolha de Zohran Mamdani para a liderança do Corpo de Bombeiros da Cidade de Nova Iorque (Fire Department of New York, FDNY) tornou-se, ainda antes da sua tomada de posse, um foco de confronto político e cultural. Ao anunciar Lillian Bonsignore como futura comissária do FDNY, Mamdani deixou explícito que a inclusão e o reconhecimento de percursos profissionais sólidos fazem parte do seu projeto político, mesmo quando isso implica enfrentar resistência organizada por setores conservadores.

A reação surgiu de forma quase imediata e seguiu um padrão já conhecido por muitas pessoas LGBTI+. Em vez de uma análise séria ao currículo e à experiência acumulada, o debate foi rapidamente deslocado para a identidade da nomeada. A sua orientação sexual e o simbolismo da nomeação passaram a ser tratados como um problema, enquadrando a decisão como um gesto ideológico ou um risco para a segurança pública.

O percurso de Lillian Bonsignore no centro do sistema de emergência

Lillian Bonsignore construiu uma carreira de 31 anos no FDNY, maioritariamente no seio dos serviços médicos de emergência. Terminou o seu percurso profissional como responsável máxima pelas operações de Serviços de Emergência Médica, um cargo que exige coordenação de respostas a crises em larga escala e decisões constantes sob elevada pressão operacional. Trata-se de uma experiência profundamente ligada ao funcionamento diário do sistema de emergência da cidade.

Ao longo da sua carreira, Bonsignore foi quebrando barreiras institucionais. Tornou-se a primeira mulher a liderar a divisão de EMS do FDNY e a primeira mulher a alcançar a patente de quatro estrelas no departamento. A sua liderança durante a pandemia da COVID-19 foi amplamente reconhecida, num contexto em que as equipas de EMS estiveram na linha da frente, enfrentando riscos acrescidos e uma sobrecarga sem precedentes.

É também relevante que Bonsignore tenha recebido o apoio dos três sindicatos do FDNY, representando pessoas bombeiras, oficiais e profissionais de emergência médica, um consenso raro numa estrutura marcada por tensões internas. Será assim a primeira mulher lésbica a liderar o FDNY, um dado histórico que rapidamente se tornou central no ataque conservador à sua nomeação.

A ofensiva conservadora e o uso do alarmismo

A reação da esfera MAGA foi rápida e agressiva. O ataque mais mediático partiu de Elon Musk, que afirmou publicamente que “pessoas vão morrer por causa disto”, sem apresentar qualquer evidência que sustentasse tal afirmação. A declaração foi amplamente difundida nas redes sociais e serviu de ponto de mobilização para comentadoras e figuras políticas alinhadas com a direita radical.

Outras vozes conservadoras seguiram a mesma linha, insistindo que Bonsignore não teria perfil adequado por não provir diretamente do corpo de bombeiros. Esta crítica revelou-se, no entanto, seletiva. Várias pessoas que ocuparam recentemente o cargo de comissária ou comissário do FDNY não tinham percurso como bombeiras ou bombeiros, incluindo nomeações feitas durante o mandato do ainda presidente da câmara. Nessas ocasiões, a ausência desse perfil específico não gerou indignação pública comparável.

Experiência ignorada e identidade como alvo

Importa sublinhar que a maioria das chamadas geridas pelo FDNY são de natureza médica, o que torna particularmente relevante a experiência acumulada por Bonsignore na área dos serviços de emergência médica.

É neste sentido que Mamdani respondeu diretamente às acusações de Musk:

A experiência importa, e é por isso que nomeei a pessoa que passou mais de 30 anos no EMS. Sabe, a força de trabalho que aborda pelo menos 70% de todas as chamadas que entram no FDNY?

Para muitas pessoas que acompanharam o debate, tornou-se evidente que a polémica não se centrava verdadeiramente na competência técnica, mas na dificuldade de aceitar uma mulher lésbica, assumida e altamente qualificada, num dos cargos mais simbólicos do poder municipal nova-iorquino.

Este tipo de reação não é novo para a comunidade LGBTI+. Quando pessoas queer acedem a posições de poder, a sua competência tende a ser escrutinada de forma desproporcionada, enquanto a identidade é usada como argumento implícito para questionar a legitimidade da liderança.

A resposta de Eric Adams e a escalada da tensão

A tensão política intensificou-se quando Eric Adams, o ainda Presidente da Câmara de NYC, reagiu ao anúncio de Mamdani empossando rapidamente a sua própria escolha para o cargo, Mark Guerra, apenas horas depois. Guerra ficará no posto até ao final do mandato de Adams, a 31 de dezembro, num gesto amplamente interpretado como manobra política e desafio direto à autoridade do presidente da câmara eleito.

Este episódio reforçou a leitura de que a controvérsia ultrapassa largamente a esfera administrativa, assumindo contornos de disputa simbólica sobre o rumo político da cidade e sobre quem tem legitimidade para exercer poder.

Compromissos assumidos com a comunidade LGBTI+

A postura de Mamdani está alinhada com os compromissos assumidos durante a campanha eleitoral. O agora presidente da câmara eleito obteve um apoio expressivo do eleitorado LGBTI+ e prometeu defender a comunidade trans, resistir a retrocessos federais nos direitos LGBTI+ e ainda criar um gabinete municipal dedicado às questões LGBTIQA+.

A nomeação de Bonsignore surge, assim, como uma tradução concreta dessas promessas e não como um gesto simbólico isolado.

O que este episódio revela sobre poder e representação

Este caso expõe uma dinâmica recorrente: quando pessoas LGBTI+, em particular mulheres queer, chegam a posições de poder, a sua competência é frequentemente colocada em causa antes mesmo de poder ser exercida. A identidade transforma-se num alvo político, mascarado de preocupação técnica ou institucional.

Ao recusar recuar perante o ataque, Mamdani sinaliza que a inclusão não será negociável, mesmo sob pressão intensa. Para muitas pessoas LGBTI+ em Nova Iorque, essa firmeza representa talvez o aspeto mais relevante deste momento político: a confirmação de que lideranças aliadas não abandonam os seus compromissos quando a diversidade deixa de ser abstrata e passa a ocupar espaços reais de decisão.


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