Os triunfos e as tragédias de Trixie Mattel em Moving Parts

Muitos dizem que estamos a viver a idade de ouro do drag, com a arte tantas vezes marginalizada a atingir as massas e a influenciar a cultura popular de forma revolucionária. Tendo em conta a ameaça de perdermos os direitos que adquirimos nas passadas décadas, é interessante ver uma expressão artística tão intrinsecamente queer a singrar. 

Muitas drag queens adquirem hoje um estatuto de super-estrela com RuPaul’s Drag Race, mas poucas tiveram um percurso tão invulgar como Trixie Mattel. A barbie da sétima temporada foi eliminada duas vezes e só teve real sucesso depois da série, nomeadamente com outra companheira de temporada, Katya (Zamolodchikova). Juntas criaram uma webseriesUNHhhh, que depois de um sucesso sem precedentes, tornou-se numa série de televisão. Mas com pouca longevidade, já que sofreu o grande percalço de Katya ter saído da série devido a problemas de saúde mental e toxicodependência.

Este documentário, Moving Parts, realmente ao estilo cinema verité e não um subproduto de Drag Race, acompanha a vida de Trixie nesta altura da carreira, que parece nos píncaros no início do filme, mas é ameaçada por esta gigante pedra na engrenagem. E assim vemos os limites da arte do drag, ou a falta deles, nos dias de hoje, em que uma história queer, apesar de envolta em percalços, pode ser, efetivamente, inspiradora.

A contrastar com o visual absolutamente plástico de Trixie está a componente de artista e compositora folk e country, claramente inspirada em Dolly Parton e Loretta Lynn, absolutamente surreal para uma drag queen. Os concertos de Trixie, acompanhada por uma guitarra ou uma auto-harpa, são estranhos eventos nos quais existe uma mistura inédita de comédia stand-up com música tremendamente pessoal e minimalista.

É esta dualidade de Trixie que pontua o filme e também parece pontuar o seu sucesso. Moving Parts acaba por ser um filme sobre mais que uma drag queen e toca em assuntos que afetam a comunidade LGBTI de forma direta, nomeadamente o abuso infantil e os problemas do foro mental, que contaminam e potencialmente destroem relacionamentos sólidos. Um visionamento essencial para fãs de drag e, se calhar ainda mais, para quem desconhece completamente a arte e quem está por detrás dela.

Documentário agora disponível internacionalmente on-demand no Vimeo

Nota: Texto revisto pela Ana Teresa.


A esQrever no teu email

Subscreve e recebe os artigos mais recentes na tua caixa de email

Respostas de 3 a “Os triunfos e as tragédias de Trixie Mattel em Moving Parts”

  1. […] trans Marsha P Johnson e da Sylvia Rivera e a sua importância no movimento LGBTI, tal como ao novo documentário de Trixie Mattel: Moving Parts.Estranhamente – ou talvez não – lança-se o pedido de que nos chegasse correio… […]

    Gostar

  2. […] concurso em Los Angeles onde tal é a regra. É a mais prolifica de todas as drag queens, a par de Trixie Mattel, na sua carreira musical e durante esta pandemia tem feito shows online onde angaria dinheiro para […]

    Gostar

  3. […] a um act assente na sua (ótima) aparência física e a concertos em resorts gay norte-americanos. Trixie Mattel, a drag queen vencedora de uma das temporadas de RuPaul’s Drag Race, foi mais além e aliou a sua […]

    Gostar

Deixe uma resposta para O Country Queer de Orville Peck – esQrever Cancelar resposta

Apoia a esQrever

Este é um projeto comunitário, voluntário e sem fins lucrativos, criado em 2014, e nunca vamos cobrar pelo conteúdo produzido, nem aceitar patrocínios que nos possam condicionar de alguma forma. Mas este é também um projeto que tem um custo financeiro pelas várias ferramentas que precisa usar – como o site, o domínio ou equipamento para a gravação do Podcast. Por isso, e caso possas, ajuda-nos a colmatar parte desses custos. Oferece-nos um café, um chá, ou outro valor que te faça sentido. Estes apoios são sempre bem-vindos 🌈

Buy Me a Coffee at ko-fi.com