Marielle Franco: Condenação de assassinos ainda deixa perguntas sem resposta

Marielle Franco: Condenação de assassinos ainda deixa perguntas sem resposta

Mais de seis anos depois do assassinato de Marielle Franco, vereadora e ativista pelos direitos humanos, e do seu motorista Anderson Gomes, finalmente foram condenados os dois executores do crime que chocou o Brasil e gerou repercussão mundial. No entanto, quem encomendou o crime ainda não foi julgado, deixando uma ferida aberta para quem pretende uma justiça completa.

A 31 de outubro de 2024, o ex-polícia Ronnie Lessa, que disparou os tiros fatais, foi condenado a 78 anos e nove meses de prisão. Élcio Queiroz, motorista do veículo usado no crime, recebeu uma pena de 59 anos e oito meses. O veredito, dado pelo 4.º Tribunal do Júri do Rio de Janeiro, trouxe um sentimento de alívio e alguma justiça para as famílias e para a sociedade civil, que há anos clama pela punição dos responsáveis.

Mas o julgamento destes dois homens é apenas parte de uma luta maior. Desde a noite do assassinato, em 14 de março de 2018, a pergunta “Quem mandou matar Marielle Franco?” ecoa na sociedade brasileira e internacional. Em 2024, as detenções de Domingos Brazão, conselheiro do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro, e do deputado federal Chiquinho Brazão, ambos ligados a milícias criminosas e suspeitos de serem os mandantes, parecem aproximar a resposta, mas o processo ainda está longe do fim.

Marielle Franco: Uma voz silenciada e uma lutadora pela justiça

Marielle Franco era uma força revolucionária. Mulher negra, nascida e criada nas favelas do Rio de Janeiro, foi uma defensora incansável das comunidades marginalizadas, denunciando o abuso de poder das forças de segurança e a violência sistémica das milícias armadas. No entanto, apesar da notoriedade e do impacto da sua trajetória, a sua identidade foi, em muitos aspetos, ignorada pelos meios de comunicação. Marielle era bissexual e casada com Monica Benicio, uma informação que, na altura do seu assassinato, foi amplamente omitida nos media brasileiros e portugueses, levantando questões sobre a invisibilização das identidades LGBTI+.

Esse apagamento reflete uma tendência maior e recorrente: as identidades queer muitas vezes são silenciadas na esfera pública, especialmente em contextos de luto e de trauma coletivo.

A resiliência do legado de Marielle

Desde a sua morte, o legado de Marielle tem sido mantido vivo por ativistas, amizades e pela sua companheira Monica Benicio, que concorreu para a Câmara Municipal do Rio em 2020, levando consigo as bandeiras de Marielle. A sua coragem e compromisso transformaram Marielle num símbolo de resistência e de esperança, inspirando movimentos e ações que não cessaram de lutar contra o silenciamento e a violência.

No dia do julgamento, centenas de manifestantes concentraram-se em frente ao tribunal no Rio de Janeiro, empunhando girassóis e gritando por justiça. Esta cena de união e solidariedade reflete a persistência das causas de Marielle, que transcendem fronteiras e desafiam as estruturas de poder no Brasil.

Uma justiça ainda por completar

A condenação de Ronnie Lessa e Élcio Queiroz é um passo importante, mas insuficiente. Enquanto os alegados mandantes não forem responsabilizados, a justiça permanece incompleta, e o caso de Marielle destaca as camadas de violência e impunidade profundamente enraizadas no Brasil. A influência das milícias armadas no Rio de Janeiro, frequentemente em conluio com setores da política, é um problema estrutural que afeta diretamente a vida nas favelas e nos territórios marginalizados. As investigações apontam que, devido ao impacto do trabalho de Marielle, foi arquitetado um plano para silenciá-la, num sinal claro da ameaça que ela representava para os interesses criminosos e para os poderes instalados.

Este julgamento expõe a necessidade urgente de responsabilizar integralmente todas as pessoas envolvidas. É um lembrete de que, enquanto houver resistência, o legado de Marielle permanece vivo. Marielle Franco não foi apenas uma voz contra a opressão; ela tornou-se uma inspiração que continua a impulsionar milhões de pessoas a exigir uma sociedade mais justa e inclusiva, onde vidas negras e LGBTQI+ tenham visibilidade e dignidade.



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