
A recente vitória de Donald Trump nas eleições presidenciais dos Estados Unidos trouxe um sentimento de apreensão dentro da comunidade LGBTQ+, particularmente entre pessoas trans.
Durante a sua campanha, Trump e outras candidaturas republicanas adotaram uma estratégia de propaganda que apontava os direitos das pessoas trans como um exemplo do que consideram políticas “fora de controlo” dos democratas. Frases como “Kamala is for them” em contraste com “Trump is for you” destacavam-se como um mote destinado a polarizar a opinião pública.
Essa abordagem, que explorava o desconforto de parte da sociedade com temas de diversidade, teve como objetivo sugerir que democratas estariam fora de sintonia com o eleitorado “normal”. Através de anúncios que colocavam as pessoas trans num lugar de ridicularização ou até desdém, a retórica política assumiu contornos que ultrapassam o debate de políticas específicas e se aproximam do ataque à dignidade pessoal de uma minoria vulnerável.
Para Austin Johnson, diretor de investigação da Campaign for Southern Equality, a dor está na exposição pública desse tipo de discurso, onde a sua identidade é usada como um fator de medo. “É humilhante e embaraçoso ver os meus amigos e colegas assistirem a estes anúncios”, desabafou.
Trump promete “bullying estrutural” contra a comunidade trans
Os planos de Trump para o próximo mandato, ainda que incertos, já acenderam alertas. Ele prometeu restringir o apoio federal a escolas que promovam educação inclusiva sobre género e limitar o financiamento para tratamentos médicos de transição. Há ainda a promessa de limitar a participação de atletas trans em desportos femininos e até de dificultar a emissão de passaportes com marcadores de género atualizados.
A presidente da Human Rights Campaign, Kelley Robinson, descreve estas promessas como uma espécie de “bullying estrutural” — uma tentativa de tornar as vidas das pessoas trans mais difíceis, institucionalizando discriminações em várias esferas da sociedade.
A vitória de Trump é especialmente alarmante, pois as sondagens mostram que uma grande parte da população estadunidense ainda tem reservas sobre os direitos das pessoas trans. Cerca de metade considera moralmente errado que alguém transicione de género, e uma maioria opõe-se à participação de atletas trans em equipas que correspondam à sua identidade de género. Alguns democratas, como o deputado Seth Moulton, acreditam que a ênfase nas questões trans pode ter custado votos ao partido.
Importa reforçar que, ao contrário das crenças, o maior inquérito a pessoas trans dos EUA descobriu que as que fizeram a transição estão mais felizes e muitas têm famílias solidárias. O mesmo estudo encontrou, contudo, que muitas continuam a sofrer discriminação, assédio e violência no trabalho, na medicina e na escola.
Entre receios também há esperança
Contudo, entre o receio e a incerteza, alguns sinais de esperança emergem. A eleição de Sarah McBride, que se tornará a primeira pessoa trans no Congresso, é um desses momentos que prova que o progresso, embora lento, é possível. Organizações como a Advocates for Trans Equality, liderada por Rodrigo Heng-Lehtinen, já estão a mobilizar campanhas para mudar a opinião pública. “Estamos num período difícil em que precisamos de lutar“, afirmou Heng-Lehtinen. “Sabemos que a maioria ainda acredita que não conhece uma única pessoa trans”. Esse desconhecimento, acredita, é o que ainda alimenta o preconceito e a desinformação.
Este é um tempo de lutas e desafios, mas também de resiliência. Se o passado provou algo, é que a aceitação e o entendimento podem crescer, mesmo quando o caminho parece sombrio. Basta recuar a 2004, quando muitos estados norte-americanos aprovaram medidas contra o casamento entre pessoas do mesmo sexo, mas hoje, o casamento igualitário é um direito garantido pela lei.
Com união, visibilidade e determinação, a comunidade trans e pessoas aliadas podem continuar a avançar, lembrando que as vitórias sociais nem sempre são lineares. A resistência perante a adversidade tornou-se uma marca das comunidades LGBTQ+ ao longo da história, e agora, mais uma vez, esta é chamada à luta.

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