Squid Game: Entre a crítica ao “transfake” e a oportunidade de discussão numa Coreia do Sul conservadora face à sua comunidade LGBTQ+

Squid Game: Entre a crítica ao "transfake" e a oportunidade de discussão numa Coreia do Sul conservadora face à sua comunidade LGBTQ+

A Netflix revelou o elenco da segunda temporada de Squid Game, uma das séries de maior sucesso global, e uma das personagens pertence à comunidade LGBTQ+. Há, no entanto, um problema. A personagem em questão é Hyun-ju, uma mulher trans, e esta será protagonizada pelo ator cis Park Sung-hoon. A decisão gerou críticas e reabriu o debate sobre a representatividade trans na televisão e cinema.

Hyun-ju, descrita como uma ex-soldado trans que entra no jogo para financiar uma cirurgia de afirmação de género, será apresentada como uma personagem resiliente e inspiradora. Segundo Park Sung-hoon, a personagem “enfrenta preconceitos e situações difíceis, mas demonstra força, liderança natural e quebra estereótipos”. No entanto, a escolha de um homem cis para o papel foi vista como um retrocesso numa altura em que a indústria tem vindo a questionar a prática conhecida como “transfake”.

Nos últimos anos, atores cis que interpretaram personagens trans, como Eddie Redmayne e Felicity Huffman, admitiram que não aceitariam esses papéis atualmente, reconhecendo que histórias trans devem ser contadas por intérpretes trans.

Da mesma forma, o casting de Park Sung-hoon reforça a ideia errada de que mulheres trans não são verdadeiras mulheres e perpetua estereótipos.

Contexto cultural e político na Coreia do Sul sobre os direitos LGBTQ+

A controvérsia em torno do casting surge num país onde os direitos LGBTQ+ ainda enfrentam obstáculos consideráveis. Apesar de avanços culturais e sociais noutros campos, a Coreia do Sul mantém uma posição conservadora em relação a questões de género e sexualidade.

Por exemplo, não existem leis antidiscriminação específicas para pessoas LGBTQ+, e tentativas de criá-las têm sido bloqueadas por grupos conservadores. Casamentos ou uniões civis entre pessoas do mesmo sexo não são reconhecidos legalmente, deixando casais LGBTQ+ sem acesso a direitos básicos, como herança ou benefícios de saúde.

Também os direitos específicos às pessoas trans são frágeis no país. Embora o acesso a cuidados de afirmação de género seja legal a partir dos 20 anos, exige aprovação médica e judicial. Além disso, a discriminação social e profissional continua a limitar as oportunidades para pessoas trans.

A sociedade sul-coreana é fortemente influenciada por valores tradicionais e pela religião, sobretudo o cristianismo conservador, que tem grande peso político e social. Isso contribui para uma resistência cultural à aceitação plena da diversidade sexual e de género.

O ativismo LGBTQ+ ganha aos poucos terreno e Squid Game pode ajudar a lançar discussão pública

Apesar dessas barreiras, há sinais de mudança. Movimentos jovens e iniciativas de ativismo LGBTQ+ têm conseguido alguma visibilidade, especialmente através de festivais culturais, redes sociais e produções independentes.

Embora a introdução de uma personagem trans em Squid Game possa aumentar a visibilidade das questões trans na Coreia do Sul, o casting de um ator cis para o papel de Hyun-ju levanta questões importantes sobre representatividade e autenticidade.

Com a estreia marcada para 26 de dezembro, a série não só promete captar a atenção global, como também iniciar conversas cruciais sobre inclusão e igualdade, dentro e fora da Coreia do Sul. Confere o trailer da segunda temporada de Squid Game abaixo.



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Uma resposta a “Squid Game: Entre a crítica ao “transfake” e a oportunidade de discussão numa Coreia do Sul conservadora face à sua comunidade LGBTQ+”

  1. […] Hwang Dong-hyuk, criador e realizador de Squid Game, abordou a polémica na comunidade LGBTQ sobre a decisão de escolher Park Sung-hoon, um ator cisgénero, para interpretar Hyun-ju, uma mulher trans. Esta decisão gerou uma onda de controvérsia online desde que foi anunciada. […]

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