
O Bloco de Esquerda anunciou a candidatura de Júlia Mendes Pereira à Câmara Municipal do Entroncamento nas eleições autárquicas deste outono. A dirigente distrital e nacional do partido, também membro da UMAR – União de Mulheres Alternativa e Resposta –, assume esta candidatura com uma forte componente de combate político e visibilidade trans.
“Enquanto mulher trans, vou caminhar sem medo”, afirmou Júlia Mendes Pereira em entrevista ao Expresso. Perante o crescimento da extrema-direita, a candidata bloquista sublinha: “A preocupação maior é o crescimento da extrema-direita numa cidade tradicionalmente de esquerda, mas onde o crescimento da extrema-direita é brutal.”
Nas eleições legislativas deste ano, o Chega ficou em primeiro lugar no Entroncamento. “Esta é uma cidade que está a crescer muito também devido à imigração. A extrema-direita está a aproveitar isso espalhando desinformação e criando um clima de insegurança que é completamente infundado. É essa sensação de medo que queremos combater.”
Consciente dos riscos, Júlia reforça: “Não posso dizer que me candidatei de ânimo leve ou que não estou consciente dessa possibilidade. Temos visto o nível de discurso e de ataque à esquerda no geral e, concretamente, ao Bloco e à Mariana Mortágua e sei que não estou livre dessas situações.”
“Enquanto mulher trans, sei que a exigência para mim e para pessoas como eu é sempre acrescida. Estou consciente disso, vou caminhar sem medo e com um foco muito claro de fazer frente ao neofascismo e ao crescimento da extrema-direita.”
A candidatura tem também uma dimensão de representatividade: “Vejo o quão sozinha estou neste caminho”, afirma. “Por isso, tenho consciência do marco e da necessidade de abrir espaços de visibilidade e de demonstrar que uma mulher trans é capaz de assumir um combate como este.”
Esta não é a sua primeira candidatura. Em 2015, Júlia Mendes Pereira tornou-se na primeira mulher trans a candidatar-se à Assembleia da República em Portugal, também pelo Bloco de Esquerda.
A candidata pretende agora recuperar uma presença bloquista no executivo da Câmara Municipal do Entroncamento, que o partido assegurou durante 20 anos, até 2021. “O Entroncamento é a única cidade em que o Bloco elegeu logo nas primeiras autárquicas em que se candidatou [em 2001] e manteve-se com um vereador até 2021. É essa continuidade e legado autárquico que espero conseguir recuperar.”
A candidatura foi aprovada pela assembleia concelhia do Bloco e será ratificada pela Mesa Nacional do partido no dia 28 de junho. A lista inclui ainda Gonçalo Serras, músico e compositor, como número dois, e Rita Marçal, jovem estudante, como número três. Para a Assembleia Municipal, a lista será encabeçada por Santiago Mbanda Lima, ativista antirracista e defensor dos direitos das pessoas intersexo.
Num contexto marcado por discursos de ódio e exclusão, Júlia Mendes Pereira afirma-se como símbolo de coragem e resistência, trazendo visibilidade a quem continua invisível na política institucional.

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