
Sem julgamento. Sem provas. Andry Hernandez Romero está preso em El Salvador, num centro de alta segurança, por ser gay, migrante e ter duas coroas tatuadas.
No final de março, uma imagem correu mundo: dezenas de homens ajoelhados, cabeças raspadas, mãos atadas, vestes brancas — todos empilhados uns sobre os outros no chão de cimento da prisão CECOT, em El Salvador.
Enquanto o fotojornalista Philip Holsinger documentava o corte forçado e violento do cabelo e barbas dos detidos, um grito destacou-se: “Sou inocente! Sou gay!” Era Andry Hernandez Romero, maquilhador venezuelano de 31 anos, detido sem julgamento após ter sido deportado dos Estados Unidos.
Quem é Andry Hernandez Romero?
Andry é um artista com ligação ao mundo das pageants e teatro, natural de Capacho, Venezuela. Deixou o seu país para escapar à perseguição por ser gay e pelas suas posições políticas.
Procurava asilo nos EUA e já tinha feito a chamada “entrevista de medo credível” — um passo importante no processo. O governo estadunidense reconheceu a validade das ameaças que enfrentava. Mas um dia, desapareceu.
Segundo a sua advogada, Lindsay Toczylowski, do Immigrant Defenders Law Center, “Ele era um artista doce, divertido. Agora está nas condições mais horríveis que consigo imaginar.”
Um ato político e ideológico

Andry Hernandez Romero foi um dos 238 migrantes venezuelanos deportados a 15 de março pela administração Trump, com base no Alien Enemies Act, uma lei de 1798 raramente usada e com um passado sombrio — foi invocada durante a Segunda Guerra Mundial para internar a população japonesa residente nos EUA. Desta vez, a acusação foi de alegadas ligações ao gangue Tren de Aragua. A “prova”? Duas tatuagens de coroas e perfis nas redes sociais.
Mas segundo o seu tatuador, “Entre 2017 e 2019, fiz mais de 60 tatuagens de coroas a pessoas da nossa cidade. Era uma tendência.” Já a advogada acrescenta: “As coroas estão sobre os nomes dos pais dele. A explicação mais plausível? São o rei e rainha dele.”
Recordamos a ligação de Andry ao mundos dos pageants, onde as coroas têm um significado de celebração e de orgulho.
A prisão onde os direitos desaparecem
CECOT, o megacomplexo prisional de El Salvador, é descrito como o maior centro de reclusão da América Latina. É também um local onde a ausência de julgamento e os maus-tratos são rotina. Romero foi fotografado por Philip Holsinger ao chegar à prisão. O fotojornalista relatou que “ele começou a rezar e a gritar pela mãe enquanto era esbofeteado.”
“Vê-los ali, empilhados, foi como assistir a pessoas a desaparecer. Tornaram-se fantasmas”, relembrou.
LGBTQ+ sob ataque
As pessoas LGBTQ+ são desproporcionalmente afetadas por sistemas de imigração brutais. Um relatório recente mostra que quase todas as pessoas LGBTQ+ detidas nos EUA sofreram assédio por serem queer ou migrantes, e quase metade reportou agressões sexuais.
Andry é um exemplo doloroso do que acontece quando se cruzam homofobia, xenofobia e autoritarismo.
O silêncio é cúmplice
Enquanto as autoridades dos EUA mantêm o silêncio sobre o caso, cresce a pressão internacional para que Andry Hernandez Romero seja libertado e o seu processo revisto. Até ao momento, continua detido, invisível, numa prisão que apaga identidades. Mas não devia estar.
“É como se a sua vida tivesse deixado de existir. És apenas uma pessoa com roupas brancas agora“, recordou Holsinger.

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