Esta semana o set de 7 chega à segunda-feira, porque é uma semana especial – a semana do festival Eurovisão da Canção ou, para manter o tom internacional, Eurovision Song Contest (ESC). Fazemos assim um pequeno desvio da rotina habitual para abordar este tema em específico, e na próxima semana retomamos os moldes habituais.
O ESC faz parte da memória comum de Portugal e continua a ser um foco de opiniões completamente díspares – há quem viva para este evento e saiba tudo sobre a sua história, há quem o considere o espetáculo mais piroso do ano, há até (imagine-se!) quem lhe seja indiferente. Trata-se da competição internacional de canções com maior longevidade do mundo, que integra como concorrentes essencialmente os países membros da European Broadcasting Union (EBU), e que teve a sua primeira edição em 1956. Na década de 1950 a Europa estava ainda a recuperar dos efeitos devastadores da guerra, e um dos principais objetivos da criação deste festival foi o de criar uma forma de juntar os vários países da EBU em torno de um programa de entretenimento ligeiro. O conceito do ESC foi baseado no festival de música de Sanremo, e na altura da sua introdução foi encarado como uma experiência tecnológica na televisão em direto, pretendendo-se a sua transmissão simultânea em todos os países da união, um projeto muito ambicioso para uma altura em que nem existia televisão por satélite.
Apesar do termo “Eurovision”, a elegibilidade dos países concorrentes não está ligada diretamente à sua inclusão geográfica no continente europeu, nem tem relação com a União Europeia. Uma das adições mais recentes à lista de países participantes que claramente não cumpriria com um critério geográfico foi a Austrália, em 2015. A sua participação neste ano foi apresentada inicialmente como um evento único, pretendendo comemorar o 60º aniversário do ESC e ao mesmo tempo reconhecer o sucesso do mesmo naquele país. Tendo-se concluído pelo resultado positivo decorrente desta alteração, posteriormente veio a ser veiculado que a Austrália passaria a ser um país participante também nas edições seguintes, o que tem sucedido até hoje.
Portugal participou pela primeira vez no ESC em 1964, representado por António Calvário com a canção “Oração”, tendo ficado em 13º lugar com a honrosa pontuação de… zero pontos. Vendo o lado menos negativo, e já que “misery loves company” – não fomos os únicos. Nessa mesma edição também a Alemanha, Jugoslávia e Suíça tiveram a mesma pontuação. E, continuando na perspetiva positiva, há também um recorde a ter em conta: Portugal é, neste momento, o país que participou mais vezes sem nunca ter ganho (aliás, sem nunca sequer ter chegado aos primeiros cinco lugares – a melhor qualificação até hoje foi obtida por Lúcia Moniz, em 1996, com “O meu coração não tem cor”, um 6º lugar. Portugal já recebeu alguns prémios, no entanto: em 2008 Vânia Fernandes, com “Senhora do mar (negras águas)” recebeu o prémio Marcel Bezençon, atribuído pela imprensa, que reconhece a qualidade da canção apresentada e, em 2006, as Nonstop, com a música “Coisas de nada”, receberam o prémio Barbara Dex, que premeia os artistas mais mal vestidos em cada edição do ESC.
Talvez à custa deste historial o ESC tem vindo a assumir um papel cada vez menos marcante na cultura portuguesa, embora durante largos anos fosse algo que fizesse o país parar para assistir, como aliás o próprio Festival da Canção, através do qual se selecionam geralmente os representantes nacionais. Os resultados menos impressionantes a nível internacional e, ao que parece, uma certa desorientação dos responsáveis pelo Festival da Canção em relação ao rumo a dar a este certame, aliados ao facto de hoje em dia ser cada vez mais difícil captar a atenção do público para um tema em específico, foram fazendo com que, em Portugal, o ESC e o próprio Festival da Canção perdessem parte da sua magia – o que não sucede, por exemplo, na Suécia, em que estes espetáculos continuam a reunir multidões, e que não reflete a enorme audiência do ESC, que, em 2016, chegou a ser visto por mais de 200 milhões de pessoas.
Este ano, a RTP anunciou alterações significativas ao formato do Festival da Canção, procurando fazer renascer a grandiosidade que teve nos seus momentos áureos, o que explica, em parte pelo menos, o sentimento de desilusão dos fãs do ESC pela concretização desses planos, que resultaram num programa com falta de direção e em que a aposta nos talentos nacionais atuais parece não ter sido devidamente aproveitada. Sem prejuízo das falhas do programa em si, obteve-se um representante que, embora gere tantas reações positivas como negativas, é, subjetivamente, um bom exemplo de música de qualidade que, independentemente da posição que venha a conquistar no ESC, não deixará de ser uma ótima forma de representar Portugal. Tendo dito isto, fica o desejo de muito boa sorte para o Salvador Sobral, para a Luísa Sobral e para a equipa que os acompanha.
No final deste pequeno resumo relativo ao ESC, fica a saudade dos momentos vividos em família, ou entre amigos, em que o ESC era assistido com mais emoção. Com vista a contribuir para que esse sentimento renasça, fica aqui um pequeno presente inspirado em tempos idos, quando as revistas dedicadas aos eventos da televisão traziam consigo tabelas para que os espetadores pudessem marcar os seus favoritos na competição. Assim, sintam-se motivados para utilizar as tabelas abaixo, imprimam e partilhem com quem quiserem, e tomem nota das músicas que mais vos impressionem em cada semi-final do ESC 2017, e lembrem-se da diversão de há anos atrás.

Após todo este enquadramento da semana eurovisiva, passamos à música propriamente dita. Como seria de esperar, a playlist selecionada para esta semana aborda também esta temática, até para desmistificar a ideia de que o ESC se resume a um espetáculo em que o mais importante é chamar a atenção (não necessariamente pela positiva) e não a própria música. Assim, este set de 7 é composto de uma seleção de algumas das músicas mais interessantes que surgiram nos últimos cinco anos no ESC, com um foco especial no ano passado, e não incluindo, propositadamente, qualquer das músicas que participarão este ano para não influenciar a vossa apreciação do ESC 2017. Fiquem assim com algumas informações sobre os artistas selecionados para o set de 7 #ESC.
Laura Tesoro – What’s the pressure (Bélgica 2016)
Laura Tesoro representou a Bélgica na Eurovisão 2016, onde terminou em 10º lugar. Laura trabalhou inicialmente como atriz, tendo tido a sua estreia numa série dramática, ao que se seguiu a participação em alguns musicais, como “Annie”, e numa telenovela. Posteriormente participou também no programa “The Voice van Vlaanderen”, a versão do programa “The Voice” na parte flamenga da Bélgica, onde terminou em segundo lugar. A sua participação da Eurovisão surgiu na sequência de uma seleção nacional em que tanto o voto do público belga como de um júri internacional a levaram à vitória. Na sua vida pós-Eurovisão, Laura emprestou a voz a algumas personagens na dobragem flamenga dos filmes de animação “Trolls” e “Moana” e, já este ano, lançou o seu mais recente single, “Higher”.
Amir– J’ai cherché (França 2016)
Amir Haddad é um cantor e compositor franco-israelita que representou a França na Eurovisão de 2016, tendo terminado em 6º lugar. Amir nasceu em Paris mas imigrou para Israel aos 8 anos de idade, tendo desde sempre cantando em eventos na sinagoga frequentada pela família e em vários eventos sociais. Como vários dos concorrentes da Eurovisão, Amir participou em programas de novos talentos, tendo sido eliminado relativamente cedo da versão israelita do programa “Pop Idol” (mas que lhe permitiu ainda assim reunir um significativo conjunto de fãs) e, já novamente em França, terminou em terceiro lugar no programa “The Voice“. Recentemente Amir lançou o single, “Au cœur de moi”, o primeiro do seu próximo álbum com o mesmo nome. Uma curiosidade: Amir nasceu com perda de audição de 50%, ouvindo apenas do lado esquerdo.
Aminata – Love injected (Letónia 2015)
Aminata é uma cantora, compositora, produtora e, numa área menos relacionada (pelo menos diretamente) com música, modelo, que representou a Letónia na Eurovisão em 2015, tendo terminado em 6º lugar. Aminata teve uma educação em música e participou em diversos programas de televisão durante o final da sua adolescência, tenho chamado atenção internacional quando concorreu, em 2014, ao equivalente letão do Festival da Canção, onde terminou em quinto lugar. Em 2015 voltou a concorrer e desta vez foi a vencedora, com a música que acabaria por levar à Eurovisão e, na mesma altura, lançou o seu primeiro álbum, “Inner voice”. Aminata ganhou experiência adicional na Eurovisão ao escrever também a música que viria a representar a Letónia em 2016, bem como uma das concorrentes à seleção nacional da Letónia para a Eurovisão 2017, a qual viria, no entanto, a ser eliminada. O gosto pela participação neste tipo de competições parece ter-se mantido, sendo que em 2016 esta artista participou ainda na edição russa do programa “The Voice” (em que uma das juradas era Polina Gagarina, que tinha representado a Rússia na Eurovisão em 2015), tendo sido eliminada nas primeiras fases. Em Outubro de 2016 Aminata lançou o seu segundo álbum, “Red Moon”, do qual “Fighter” foi um dos primeiros singles.
Anouk – Birds (Holanda 2013)
O interesse de Anouk pela música surgiu desde nova, bastante por influência da sua mãe, que era uma cantora de blues. Depois de uma adolescência conturbada relacionada com a utilização de drogas, que levaram a que vivesse em casas de cuidado após ter fugido da casa de família aos catorze anos, Anouk focou a atenção na música. O seu single de estreia, “Nobody’s wife”, contribuíu largamente para a catapultar para a fama internacional e permitiu a construção de uma carreira que, até à data, conta já com onze álbuns lançados. O mais recente, “Fake it til we die”, foi lançado em outubro de 2016, sendo “I just met a man” um dos seus singles iniciais. A participação de Anouk na Eurovisão, em 2013, surgiu na sequência de um convite direto da emissora holandesa, que lhe deu liberdade na escolha da música que levaria à competição e que terminou com um 9º lugar para a Holanda.
Barei – Say yay! (Espanha 2016)
Barei é Bárbara Reyzábal González-Aller, que começou a sua carreira aos 16 anos com gravações de covers de Christina Aguilera, Laura Pausini e Lara Fabian, fazendo uso dos seus estudos em canto, guitarra, linguagem musical e piano. Depois de um período passado a fazer espetáculos regulares em salas de Madrid ainda em nome próprio, Bárbara adotou o nome artístico de Barei e lançou o seu primeiro álbum, completamente em espanhol. Seguiu-se o lançamento de singles isolados em inglês e, tendo recebido reações positivas, veio a lançar um segundo álbum em 2015 onde estes foram incluídos, bem com outros temas em língua inglesa. A sua participação na Eurovisão veio por convite da emissora espanhola, juntando-se a cinco outros candidatos, tendo vencido a final espanhola e vindo a representar a Espanha na Eurovisão em 2016, onde terminou em 22º lugar. Mais recentemente, Barei lançou o single “I don’t need to be you”, um tema que procura lutar contra o bullying.
Dami Im – Sound of silence (Austrália 2016)
Dami Im é uma cantora, compositora e multi-instrumentalista australiana (nascida na Coreia do Sul), que representou a Austrália na sua primeira participação oficial no ESC, em 2016, após a estreia deste país como convidado especial no ano anterior, e onde obteve o 2º lugar. Dami Im começou a sua educação musical na infância com aulas de piano desde os cinco anos, tendo prosseguido o seu percurso académico sempre na área musical, que culminou com ela própria a adotar a atividade de professora de música e piano. Previamente à sua participação no ESC, esta artista vinha já a construir uma carreira interessante, tendo participado e vencido a quinta edição do programa “The X Factor Australia”, e lançado três álbuns, com significativo sucesso comercial, consistindo o mais recente, de 2016, numa coleção de covers de canções dos The Carpenters. Além da música, Dami Im é também reconhecida como uma fashion trendsetter, sendo procurada por diversos designers para exibirem as suas criações.
Loreen – Euphoria (Suécia 2012)
Loreen é o nome artístico de Lorine Zineb Nora Talhaoui, uma sueca de ascendência marroquina que venceu o ESC em 2012 com “Euphoria”, a música que recebeu o maior número de pontuações máximas da história do festival, e que se tornou uma das músicas com origem na Eurovisão com maior sucesso comercial. Loreen iniciou a sua vida artística mais visível ao público com uma participação no programa “Idol 2004”, onde terminou em quarto lugar, ao que se seguiu o lançamento do seu primeiro single, “The snake”, e um período a trabalhar na área da televisão. O seu regresso mais focado à música deu-se em 2011 com a sua primeira participação no “Melodifestivalen” (o equivalente sueco do Festival da Canção), com a música “My heart is refusing me”, que acabou por não se qualificar, apesar de se ter vindo a tornar um sucesso comercial na Suécia, e posteriormente em 2012, com “Euphoria”, que se tornaria uma espécie de ícone eurovisivo. Durante a sua participação na Eurovisão 2012, que decorreu em Baku, Loreen foi a única participante a encontrar-se com ativistas de direitos humanos locais, tendo mais tarde denunciado a violação sistemática dos direitos humanos no Azerbeijão e afirmado que “One should not be silent about such things”. Após a sua vitória, e ainda em 2012, Loreen lançou o seu álbum de estreia, “Heal” (cuja audição se recomenda), tendo-se seguido o lançamento de singles isolados nos anos seguintes após sucessivos adiamentos do lançamento do seu segundo álbum, e um extenso período de digressão e participação em diversos espetáculos. Em 2017, Loreen voltou a participar no “Melodifestivalen” de 2017 com a música “Statements”, não tendo no entanto sido apurada para a final mas, tirando partido do mediatismo associado ao evento, anunciou que em 2017 lançaria dois EPs, um durante a Primavera e outro durante o Outono.
Este é o set de 7 #ESC.
Os destaques visuais desta semana assumem uma vertente um pouco diferente do habitual, já que esta é uma semana diferente. Assim, em vez de retratar os artistas que fazem parte da playlist, partilhamos alguns vídeos interessantes da história do ESC, focados em artistas famosos (uns mais, outros menos, quer seja antes quer depois da sua passagem pelo ESC), sem fazer qualquer julgamento sobre a qualidade da música (até porque, convém ter em mente, alguns destes exemplos têm já muitos anos).
Enjoy!
[Lara Fabian – “Croire”, Luxemburgo 1988 (4º lugar)]
[Blue – “I can”, United Kingdom 2011 (11º lugar)]
[Olivia Newton John – “Long live love”, United Kingdom 1974 (4º lugar)]
[Julio Iglesias – “Gwendolyne”, Espanha 1970 (4º lugar)]
[Bonnie Tyler – “Believe in me”, United Kingdom 2013 (19º lugar)]
[t.A.T.u. – “Ne Ver Ne Boysia Ne Prosi”, Rússia 2003 (3º lugar)]
[ABBA – “Waterloo”, Suécia 1974 (1º lugar)]
[Céline Dion – “Ne partez pas sans moi”, Suíça 1988 (1º lugar)]
One comment