
Carolyn Bertozzi, professora da Universidade de Stanford, nos Estados Unidos da América, ganhou o Prémio Nobel da Química e tornou-se na 59ª mulher a ganhar o prémio (contra mais de 800 homens). Ela também é orgulhosamente lésbica.
Bertozzi ganhou o Nobel com Morten Meldal, Professor da Universidade de Copenhaga, e Barry Sharpless, Professor da Scripps Research. A equipa venceu o Nobel pelo seu trabalho na “química de cliques”, maneiras pelas quais as moléculas podem encaixar-se para criar reações rápidas e evitar subprodutos.
Carolyn Bertozzi é filha de um professor de física do MIT e “uma secretária que se tornou mãe e ficou em casa”, mas que teve a chance de ir para a faculdade incentivada pela família. Bertozzi frequentou Harvard, onde, apesar de se destacar nas suas aulas, lutou como mulher para conseguir uma posição de pesquisa. Além disso, durante o seu segundo ano, a Supremo Tribunal decidiu manter uma lei anti-sodomia em Bowers v. Hardwick, “criando um sentimento instável em Bertozzi de que ela, como lésbica, havia sido criminalizada”. Assim, ela decidiu mudar-se para a Universidade da Califórnia, Berkeley, para a sua pós-graduação. A universidade tinha “uma pequena mas significativa presença feminina” no departamento de química orgânica, e estava perto de “a cidade mais gay do país” (São Francisco).
Carolyn Bertozzi disse à Chemical and Engineering News (C&EN) em abril passado que, apesar do progresso legal para a população LGBTI+ desde então, “a homofobia casual ainda existe. Eu tenho sido relativamente privilegiada e protegida disso, mas saia dos Estados Unidos, saia do Canadá, há lugares onde ainda somos punidas por sermos LGBTI, às vezes até com a morte. Nunca devemos perder de vista o facto de que a ciência é internacional.”
Ciência com cunho ativista, Bertozzi denuncia preconceito e hostilidade
Agora, ela disse: “Definitivamente tenho trolls no Twitter – qualquer mulher nas redes sociais tem – mas nada comparado à flagrante homofobia externa dos meus anos de faculdade. Surpreendentemente, porém, ser mulher era e ainda é pior do que ser lésbica”, em termos de enfrentar preconceito e hostilidade na ciência.
Apesar dos obstáculos, Bertozzi juntou-se ao corpo docente da UC Berkeley em 1996 e depois à Universidade de Stanford em junho de 2015. Ela ganhou uma “bolsa de mérito” da MacArthur em 1999, aos 32 anos, e foi eleita para o Instituto de Medicina, a Academia Nacional de Ciências e a Academia Americana de Artes e Ciências; e recebeu o Prémio Lemelson-MIT (a primeira mulher a recebê-lo), o Prémio Heinrich Wieland, o Prémio ACS em Química Pura e o Prémio de Química do Futuro Solv.
Hoje em dia, Carolyn Bertozzi “ainda sente um dever e um desejo de ser um modelo como cientista lésbica”.
Pessoa de múltiplos interesses, ela também é uma ávida levantadora de pesos e “foi a teclista de uma banda de glam metal em Harvard chamada Bored of Education, ao lado do mago da guitarra Tom Morello, que mais tarde fundou Rage Against the Machine e Audioslave”.
Carolyn Bertozzi foi a segunda pessoa assumidamente LGBTI+ a vencer um Nobel em 2022
Bertozzi foi a segunda pessoa LGBTI+ a vencer um Prémio Nobel em 2022, dias antes, Svante Pääbo, um cientista orgulhosamente bissexual, venceu o Nobel da Medicina.
Tal como defende a iniciativa portuguesa SciDoArmário, a afirmação da identidade é fulcral quando se procura promover um ambiente mais seguro e tranquilo para membros da comunidade LGBTIQ dentro da academia e da investigação científica, nomeadamente nas áreas STEM (Science, Technology, Engineering and Mathematics).
Considerando que as pessoas LGBTI+ são menos propensas a trabalhar em STEM devido à discriminação, assédio e exclusão social que encontram, Carolyn Bertozzi e Svante Pääbo são dois excelentes exemplos numa comunidade ainda invisível no mundo das áreas cientificas.