
Barbara Love, ativista feminista estadunidense que lutou pelos direitos das pessoas LGBTI+ e para que as lésbicas tivessem um lugar — e uma voz — no movimento feminista, morreu a 13 de novembro.
As causas da sua morte foram complicações da leucemia e da doença de Parkinson, disse a sua esposa, Donna Smith.
Love frequentava em jovem, na década de 1960, bares controlados pelas máfias que eram invadidos frequentemente pela polícia. Uma luz vermelha sinalizava a chegada da polícia, para que as mulheres deixassem de dançar ou de se tocar para que não fossem presas. “Somos como baratas“, disse ela sobre as suas colegas lésbicas da época. “Só saímos à noite.”
Importa realçar que, naqueles dias pré-Stonewall, uma pessoa podia ser despedida se fosse descoberto pertencer à comunidade LGBTI+. Na altura, algumas destas identidades ainda eram pouco compreendidas. Mas as famílias de forma muito frequente expulsavam de casa quem se assumisse ou fosse descoberto. Foi preciso mais de uma década , em 1973, para que a Associação Americana de Psiquiatria deixasse de considerar, por fim, a homossexualidade uma doença mental.
Mas aqueles foram anos em que a cidade de Nova Iorque foi uma paisagem fértil para o recém-empoderado movimento dos direitos LGBTI+ e o movimento feminista.
Com sua amiga Kate Millett, Barbara Love escreveria o blockbuster feminista “Política Sexual”, participaria no teatro de rua como o Colgate Dump-In, no qual ativistas derramaram produtos Colgate-Palmolive numa casa de banho que montaram na sede da empresa para protestar contra o tratamento de mulheres na linha de montagem.
“Somos o vosso pior pesadelo e a vossa melhor fantasia“
Love também estava entre um grupo de lésbicas que lutaram para serem reconhecidas pela National Organization for Women, uma batalha que foi emblemática dos primeiros anos de conflito dentro movimento feminino, que muitas vezes era visto como “muito branco e muito hétero”. A presidente da NOW, Betty Friedan, ridicularizou as feministas lésbicas como “a Ameaça da Lavanda”, um período de perseguição da comunidade LGBTI+ nos anos 1950 e 1960 nos Estados Unidos da América. Friedan via as preocupações das lésbicas como uma ameaça aos objetivos políticos do movimento feminista.

Como resposta, Barbara Love e a autora Rita Mae Brown e outras ativistas que formaram um grupo de feministas lésbicas fizeram umas camisolas com a frase “The Lavender Menace” (A Ameaça da Lavanda) e usaram-nas no Segundo Congresso de Unite Women da NOW, uma reunião realizada na primavera de 1970. Elas esconderam as camisolas com os seus casacos antes de percorrerem o público, tirarem os casacos e terem segurando cartazes onde se lia: “Somos o vosso pior pesadelo e a vossa melhor fantasia“. O grupo conquistou muitas das participantes com a sua intervenção.
(Na fotografia: Donna Gottschalk segura o póster “Sou o vosso pior medo, sou a vossa melhor fantasia” na marcha do Dia da Libertação Gay de Christopher Street, 1970.)
Barbara Love participou ativamente na edição de inúmeros livros que documentam as vivências lésbicas
Barbara Love documentou as suas experiências de amor, típicas de muitas da sua geração, no livro “Sappho Was a Right-On Woman: A Liberated View of Lesbianism” com Sidney Abbott, a sua companheira na época. Ambas escreveram o livro porque a sua ambição era serem comuns; as pessoas, brincaram elas na altura, pareciam saber menos sobre lésbicas do que sobre cães da Terra Nova. “O nosso objetivo é continuar as nossas vidas — como seres humanos, como mulheres, como lésbicas — inconscientemente, e poder gastar toda a nossa energia e tempo no trabalho ou na diversão, e nenhuma nas artes da ocultação ou no auto-ódio.”
O livro foi dedicado “àquelas que sofreram pela sua orientação sexual, mais especialmente a Sandy, que cometeu suicídio, a Cam, que morreu de alcoolismo, e a Lydia, que foi assassinada; e a todas que estão a trabalhar para criar um futuro para Lésbicas”.
Ela foi ainda a editora de “Feminists Who Changed America, 1963-1975” (2006), que contem as biografias de mais de 2.000 mulheres. Um projeto colaborativo que levou quase uma década a ser construído.
No seu livro de memórias, Barbara Love escreveu como saiu do armário ao seu pai e irmãos em 1970, quando ela tinha 33 anos. Era véspera de Natal, e ela ajudou a organizar um evento, uma vez que muitas pessoas LGBTI+ não seriam bem-vindas nas suas próprias casas para as férias. Elas levaram velas e marcharam por Greenwich Village enquanto cantavam o clássico “Silent Night”. Quando acabou, Love dirigiu-se até casa do seu pai em Nova Jersey. “Por que não estavas aqui? Perdeste tudo. E por que estás coberta de cera?”, questionou o seu irmão mais velho. Quando ela lhe revelou que era lésbica, ele respondeu-lhe: “Tens que descer desse navio. Esse navio está a afundar-se.” Ela respondeu-lhe: “Douglas, eu sou esse navio.”.