“Inclusion creates a level playing field, which allows the best talent to rise to the top. Respecting diversity of sexual orientation and gender identity should therefore be recognised as a matter of strategic importance to every company competing in the global market for talent. Minorities who are not treated fairly and who do not feel included will choose to work elsewhere. More and more companies now understand that. As a result, they are providing greater support for the rights of LGBT employees.”
Browne, John, The glass closet – Why coming out is good business
Sair do armário no local de trabalho é uma das últimas fronteiras para as pessoas LGBT. Estatisticamente, assume-se primeiro a sexualidade com @s amig@s, depois com a família e, por último, no local de trabalho. Se pensarmos um pouco sobre o assunto, apercebemo-nos que faz sentido. Afinal, “ofender” um/a patrão/patroa com a nossa sexualidade pode representar um risco acrescido de retaliações, dificuldades, bloqueios, despedimentos. Tod@s sabemos que não é fácil estar numa estrutura profissional hierarquizada, sujeit@s a olhares externos, nem sempre neutros, objetivos ou profissionais. Pessoas, seres tramados.
Isto a propósito do livro The glass closet – Why coming out is good business, de John Browne, que citei no início deste texto. Este é um livro escrito por um ex-CEO da BP e que viveu grande parte da sua vida (e ascensão) profissional dentro do armário, escondendo arduamente a sua orientação sexual e limitando toda a sua vida emocional e conjugalidade a esse território do não-dito. A história de Browne e o valente puxão que o arrancou do armário é interessante, claro, mas esgota-se ao fim de um parágrafo. Mais interessante é, para mim, o seu trabalho posterior, no qual este livro se insere, de trazer uma nova luz à dimensão profissional na vida das pessoas LGBT.
E, como evidencia o primeiro excerto, Browne põe essa dimensão fundamental ao serviço das próprias empresas e do mercado de trabalho. Uma boa empresa integra em si a diversidade, pois é dela também que parte a inovação e a capacidade de acrescentar valor num mundo marcado tantas vezes pelo cinzentismo. As indústrias criativas sabem-no, as de inovação também, mas as grandes corporações multinacionais ainda demoram a compreendê-lo.
O livro torna-se ainda mais interessante se pensarmos no mercado de trabalho como uma entidade em mutação evidente. Sim, é verdade, em certa medida, este é um livro sobre gestão. Mas numa ótica de ativismo LGBT.
“Claudia Brind-Woody is determined that IBM will not put business above its values. ‘In the past, we’ve had clients who didn’t want black or female sales reps,’ she explains. ‘We said, “Well, fine. We won’t send any. In fact, we won’t send anybody because we don’t want you as a client.”’”
Idem, ibidem
Chegad@s aqui temos de fazer inevitavelmente um parêntesis. Ativismo LGBT e capitalismo são passíveis de co-existir? Pode alguém ser um lorde, ex-CEO de uma das maiores (e piores?) empresas do mundo, e ainda assim ser um ativista LGBT? No meu entender, pode. Há uma imensa parte de pessoas LGBT que trabalham em grandes empresas, bancos, firmas de advogad@s, escolas, Estado e é necessário encontrar formas de viverem sem medo e plenamente no seu local de trabalho.
Este livro chegou-me à curiosidade devido à entrevista de Anabela Mota Ribeiro a António Simões, CEO do HSBC, por ser um dos profissionais referenciados neste livro. Alguém LGBT num lugar de poder que reclame poder e visibilidade LGBT num mundo de cinzentismo capitalista, que imponha diversidade como uma regra fundamental para ter melhores resultados, é ativista. E, sim, é possível uma empresa (grande, pequena, média) definir os seus próprios valores e assumir o seu próprio percurso ético – e, evidentemente, isso só se pode fazer com pessoas e não com manuais de conduta.
Mas voltemos ao livro.
Em resumo, Browne defende que as empresas que forem capazes de cativar e incluir plenamente a diversidade serão empresas mais bem sucedidas. E serão inevitavelmente essas empresas a ter um papel fundamental no redesenho da discriminação (como estamos a ver neste momento nos EUA nos casos das leis de discriminação, em que diversas empresas estão a ser o mais forte combatente dessas medidas).
Mas mais do que empresas, o livro fala de pessoas, e estabelece que aqueles/as que estiverem assumid@s no seu local de trabalho serão inevitavelmente melhores profissionais, primeiro porque serão mais felizes, segundo porque não terão de gastar grande parte da sua energia a escrutinar tudo e a auto-censurarem-se antes de falar.
A propósito de um testemunho de saída no armário, o livro conta-nos:
“His boss responded four hours later. He was clear that Feldman’s disclosure would make no difference to his standing in the company, and that he still valued his contributions to the team. He also asked for some feedback: he wanted to know why Feldman had waited so long to tell him that he was gay and had a partner, and asked whether he had done or said anything to make him feel uncomfortable. ‘Now I feel less guilty when you’re travelling,’ his boss wrote, ‘because I know someone is there to take care of your dog.’ (…) Feldman did not experience any hostile conversations. Rather than telling his staff directly, he dropped references to his partner in conversation. ‘They were just thankful that I finally said it,’ he says. By tearing down those barriers he started to form more meaningful personal relationships.”
Idem, ibidem
As coisas mais simples são muitas vezes aquelas que marcam a diferença no nosso dia a dia e nas relações que estabelecemos. O silêncio, quando usado como defesa, pode ser destrutivo na criação de ligações de confiança. A permanente sensação de que se está a esconder qualquer coisa está presente dos dois lados e contamina muitas vezes a dinâmica profissional. As relações de trabalho são estruturais na vivência pessoal e não deve haver confusão entre ser reservad@ e simplesmente omitir tudo o que diz respeito à “verdade” lá de casa. É bom estar à vontade, é bom sentir que o/a chefe se preocupa com o nosso cão e que as pessoas são empáticas. E muito bom também é assegurar uma proteção laboral que permita o mesmo usufruto dos direitos relativos à família e cônjuges, independentemente da orientação sexual ou identidade de género. Sair do armário é sempre um gesto coletivo, pois abre ou consolida caminho para outr@s.
Browne faz um elogio à autenticidade e à luta de tod@s @s que a perseguem mesmo à custa de sacrifícios pessoais, fazendo a sua própria mea culpa pelo tempo em que viveu armariado. Inevitavelmente compara a sua atual produtividade e alegria profissional com a sua vida anterior muito bem sucedida, e a atual ganha mesmo assim.
Mais do que uma bandeira, uma afirmação constante, estar fora do armário na vida profissional é estar bem ou num certo sentido igual a tod@s @s outr@s, a contar o fim de semana enquanto se toma o café na manhã de segunda-feira.
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