Tenho que confessar que quando me convidaram para ser orador deste Ignite hesitei. Hesitei porque, como alguns e algumas saberão, sinto-me especialmente bem nos bastidores, a organizar projetos que denunciem e lutem contra qualquer tipo de discriminação.
Mas então questionei-me se este não seria o desafio perfeito para sair da minha zona de conforto, para lá de um teclado onde há três anos iniciei o projeto esQrever e mais recentemente na ILGA Portugal, onde – num e noutro – ajudo a criar e desenvolver formas de divulgar o trabalho e a voz daqueles e daquelas que lutam por uma sociedade mais justa e igualitária. E isso, desde cedo que se tornou claro, passa precisamente pela erradicação da misoginia e do machismo.
Creio que não fujo à realidade quando digo que era um jovem por vezes inconveniente. Que em jantares de trabalho com os meus pais lançava questões que as pessoas adultas, com ou sem um sorriso nervoso, não me sabiam responder, pelo menos não de uma forma que ficasse realmente esclarecido e, mais importante ainda, sossegado e calado.
Mas a timidez não suplantou na altura a teimosia de um jovem sem resposta. Aliás, a desconfiança mantém-se hoje em dia quando ao preparar esta apresentação os resultados das pesquisas para estas imagens eram também eles reflexo do valor e da imagem que a sociedade tem das mulheres.
Imagens de força, liderança e vitória claramente surgiam com vantagem nos casos dos homens. Porque das mulheres os resultados apareciam-me tendencialmente sobre a perspetiva da objetificação por parte do homem sobre o corpo da mulher. Ao que me leva à questão:
“Porque é que há galdérias e não há galdérios?” – sim, até o corretor do computador enquanto escrevi esta apresentação aceita um e não o outro.
Mas não só: “Porque é que se assume que é a mulher que trata da lida da casa?”, mais: “Porque é que o homem apenas a ajuda nessa tarefa?”;
“Porque é que o homem se sente inferiorizado quando é conduzido por uma mulher?”
“Porque é que ela é bonita… para a idade?” Sempre a questão da idade das mulheres, parece que a partir de certa data é obrigatório mencioná-la no título ou num primeiro parágrafo de uma notícia. Acontece de igual forma para os homens?
São estas questões que, de alguma forma, importam que nós – homens e mais ou menos jovens – as façamos. Porque importa também ganharmos noção da nossa própria incoerência, quantas vezes não fomos nós cúmplices de uma ideologia que minora as mulheres?
Quantas vezes não as tratámos baseando-nos num hábito, numa tradição, num pressuposto que apenas secundariza a mulher e o seu valor? Nem sempre encontrei as respostas, mas no meu dia-a-dia fui percebendo que muitas destas situações se baseiam unicamente no preconceito contra as mulheres.
E isso, se em miúdo me confundiu e fez questionar, em adulto fez-me ver o quão inadmissíveis são estas ideias que ainda se encontram entranhadas no subconsciente da sociedade. E por isso desde cedo me declarei feminista, como não sê-lo? Como não defender isso, por nós, todos e todas nós?
Quando em pleno 2017 ainda há uma subrepresentação das mulheres nos postos de liderança (apenas 12% de mulheres nos conselhos de administração das empresas cotadas em bolsa; uma única presidente – em 46)…
…quando em 2017 ainda há uma subvalorização do trabalho realizado por mulheres (diferença salarial de 13% para um mesmo trabalho).
Por isso é que em pleno 2017 a HeForShe Portugal torna-se essencial para dar voz àqueles e àquelas que defendem a igualdade de género.
Porque quando vivemos numa sociedade mais justa e igualitária que valoriza e protege as mulheres todos e todas ganhamos e a sociedade no seu todo transforma-se, tornando-se mais competitiva e competente.
E as nossas mães, as nossas filhas, as nossas avós, tias, amigas, colegas, e até as nossas vizinhas, agradecem [que não sejamos broncos, entenda-se] Por isso, sim, hesitei inicialmente, mas aqui estou e estarei. Por todas elas. Por nós.
2 comentários