Pela Visibilidade das Identidades Trans… e muito mais

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No último dia 31 de março comemorou-se mais um Dia Internacional da Visibilidade Trans. Este dia é comemorado desde 2009 e teve por base a ideia da activista trans Rachel Crandall que sentiu a necessidade de criar um dia para celebrar positivamente esta comunidade, ao contrário do dia da memória trans onde se homenageia as vítimas de crimes transfóbicos.

Em Portugal algumas alterações têm acontecido. Felizmente, a letra T nos últimos anos ganhou algum destaque e, com isso, começou a ter mais lugar no debate público português – ainda que, infelizmente, de uma forma reduzida e, muitas vezes, negativa. A  quantidade de informação tem crescido, mas também a quantidade de desinformação. Num momento em que se comemora este dia de visibilidade é preciso chamar a atenção para esta forma negativa de dar visibilidade a determinadas questões. Pelo lado positivo, o debate público tem surgido, timidamente, mas já tem sido possível esclarecer algumas questões importantes. No contexto português a visibilidade continua a ser difícil para identidades e formas de expressão não homogeneizadas. Isto é, há maior respeito (e de uma forma concreta a palavra aceitação), mas continuam a existir noções de como deve ser uma pessoa trans. Em parte, tudo isto se relaciona com pressão social e normalização médica, o que faz com que a passibilidade continue a ser um projecto de existência e protecção pessoal extremamente importante para muitas pessoas.

Porém, após 7 anos da Lei 7/2011, que veio remover a obrigatoriedade de tratamento e esterilização obrigatória para estas pessoas a quando da mudança legal de nome e género, estamos à espera da aprovação de um novo projecto de lei que visa dar às pessoas aquilo a que têm direito: o reconhecimento pelo Estado da sua identidade que, até ao momento, tem sido o último a fazê-lo – não garantindo um direito básico a qualquer ser humano, o direito à sua identidade e personalidade. Em princípio está próxima a votação desta nova lei que, mais uma vez, vem mudar a perspectiva de como olhamos e encaramos estas pessoas. O que discutimos na sua essência é autodeterminação de género. Esta alteração irá permitir que qualquer pessoa possa alterar o seu nome e género legal no assento de nascimento sem ter necessidade de ter uma entidade terceira a validar a sua identidade. Nos últimos anos, apesar de algumas modificações positivas com a Lei 7/2011, manteve-se uma dificuldade enorme a conseguir estas mudanças porque a prática clínica continua a ser avaliar identidades: que como nós sabemos não são avaliáveis.

Podemos pensar que uma mudança legal, seja em que país for, é um grande passo, mas é necessário ter consciência que a sociedade precisa também de ser acompanhada por essa mudança. As leis também exercem o seu processo educativo, mas não se podem comprometer a mudar a sensibilidade das pessoas, bem como os seus comportamentos. A lei em si, trata de elementos específicos no quotidiano de pessoas trans, por outro lado é necessário assegurar que em todas as esferas públicas e privadas o respeito pelas identidades trans continue a ser exercido. Acredito na formação como propulsor de enorme potencial, porém é necessário ir mais longe. É necessário trazer para a visibilidade todas as formas de existência não padronizadas, não homogeneizadas. Diminuir a hegemonia criada pelo discurso político, mediático e popular. É preciso dar visibilidade à diversidade e não só a determinadas formas de existir.

Desta forma, não nos podemos esquecer que a visibilidade não é só uma forma de trazer para o mundo da normatividade formas alternativas de se ser e existir, mas sim uma forma política de procurar conquistar um espaço que deveria ser de todas as pessoas. A visibilidade é uma força política, é criar união e procurar um espaço seguro num mundo que, em si, é cruel e difícil.

Não nos esqueçamos, ser visível é a força de existir. Não queremos um dia de visibilidade, queremos que todos os dias sejam de visibilidade e de existência pura, sem medos, inseguranças ou repressões.

Porque somos e somos cada vez mais. Porque somos e temos orgulho nisso. Porque existir fora da normatividade é também uma forma de mostrar ao sistema que, sim, é possível existir em liberdade.

Porque, sim, queremos ser livres.

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