Portugal em 7º lugar no relatório anual da ILGA Europe com espaço para evoluir: proibição das ‘terapias de conversão’ e melhorias no acesso a asilo e cuidados de saúde

A ILGA Europe divulgou o seu relatório anual referente ao ano de 2021 onde documenta os desenvolvimentos jurídicos, políticos e sociais em 54 países e 4 instituições europeias. É um relatório único que acompanha as principais tendências – positivas e negativas – em relação à igualdade LGBTI e direitos humanos na Europa e Ásia Central. Portugal aparece na sétima posição, com muitos pontos positivos, algumas preocupações e um punhado de caminhos apontados para uma maior defesa e igualdade das pessoas LGBTI.

Na imagem global do relatório houve um forte aumento em 2021 da retórica anti-LGBTI de figuras políticas e líderes, o que alimentou uma onda de violência, com crimes de ódio anti-LGBTI relatados em todos os países em 2021, enquanto, por outro lado, a resposta a esta tem sido uma determinação aliada em muitos países para combater o ódio e a exclusão das pessoas LGBTI.

Outro elemento marcante neste estudo é a instrumentalização emergente da bandeira do arco-íris como um símbolo de divisão em vez de unidade. Criada há mais de 40 anos por um membro da comunidade LGBTI como uma representação digna da sua diversidade e coerência, ao longo de 2021 a bandeira do Orgulho foi usada tanto por apoiantes como por pessoas detratoras de pessoas LGBTI. Tal ficou evidente em junho, quando, durante o Campeonato Europeu de Futebol, a UEFA recusou-se, por motivos políticos, autorizar que um estádio de futebol de Munique fosse iluminado com as cores do arco-íris como uma demonstração de apoio às pessoas LGBTI na Hungria. Ao longo dos meses seguintes, há relatos de bandeiras arco-íris queimadas, derrubadas e instalações públicas pintadas com arco-íris profanadas em diversos países, incluindo Croácia, Alemanha, Irlanda, Itália, Holanda , Noruega, Finlândia e Espanha.

Por trás dessa divisão simbólica, a situação dos direitos humanos das pessoas LGBTI na Europa e na Ásia Central é cada vez mais complexa, com certos grupos a tornarem-se cada vez mais vulneráveis. A retórica anti-género e anti-trans permaneceu generalizada, forte e constante, visando especialmente a população jovem. As alegações das forças da oposição de que a autodeterminação de pessoas trans é prejudicar a menores levaram a mudanças tangíveis, com várias clínicas na Suécia, por exemplo, a remover a prestação de serviços para jovens trans que estão nas suas listas de espera.

De longe, o compromisso mais forte sobre os direitos LGBTI da União Europeia ocorreu quando a Comissão, em julho de 2021, abriu processos de infração históricos contra a Hungria e a Polónia. Os processos contra a Hungria dizem respeito à censura de um livro infantil que retrata personagens LGBTI e à legislação anti-LGBTI que entrou em vigor em junho. Os procedimentos contra a Polónia deveram-se devido à recusa de esclarecer se as pessoas LGBTI são discriminadas no mercado de trabalho nas chamadas “Zonas Livres LGBT” do país.

Portugal

Portugal conseguiu a sétima posição entre os 49 países analisados:

Fonte: ILGA-Europe.

ASILO
A ILGA Portugal, em parceria com a Queer Tropical e a AMPLOS, realizou formações para organizações LGBTI+ sobre questões de migração e asilo e dará formação sobre questões LGBTI+ a ONG que trabalham em migração e asilo.
Em agosto, a ILGA Portugal emitiu uma declaração exortando o governo a agir de forma proativa e salvaguardar a segurança e a integridade das mulheres afegãs, ativistas e pessoas LGBTI+. Portugal já recebeu requerentes de asilo provenientes do Afeganistão e a ILGA Portugal e a Associação Plano i estão a cooperar para apoiar uma família LGBTI.

DISCURSO DE ÓDIO
Em outubro passado, uma conhecida figura fez comentários transfóbicos ao abordar a paralisação de funcionárias da Netflix exigindo melhor apoio a colegas trans e não binárias. Isso desencadeou uma conversa mais ampla sobre a “cultura do cancelamento” em Portugal.

VIOLÊNCIA
Entre janeiro e início de novembro de 2021, a ILGA Portugal recebeu um total de 725 pedidos de contato ou apoio imediato em casos de violência doméstica, perda de rendimentos e despejos. Destes, 254 vieram de pessoas que entraram em contato pela primeira vez. 98 casos de violência doméstica e agressão foram relatados, dos quais 50 são casos de violência baseada em género.

EDUCAÇÃO
Em janeiro, a ONG Plano i publicou os resultados de sua pesquisa de 2020, descobrindo que 9% das pessoas entrevistadas sofreram bullying pela sua orientação sexual e 4% pela sua identidade de género.

A AMPLOS publicou um guia para escolas sobre questões LGBTI.

IGUALDADE E NÃO DISCRIMINAÇÃO
A sociedade civil expressou séria preocupação com a nomeação de João Caupers como presidente do Tribunal Constitucional em fevereiro. Caupers é conhecido por posições homofóbicas e anti-direitos humanos, inclusive sobre igualdade no casamento.

FAMÍLIA
A AMPLOS publicou três guias para apoiar famílias de pessoas LGBTI.

POLÍTICA ESTRANGEIRA
Portugal assinou a declaração conjunta de 18 Estados-Membros da UE condenando a lei de propaganda húngara,
mas apenas após o fim da Presidência do Conselho da União Europeia, no final de junho. Inicialmente, Portugal apenas condenou a lei, dizendo que o país precisava ser ‘neutro’ durante a sua presidência.
Em junho, a ILGA Portugal participou no Seminário de Cidadania LGBTI organizado pela Comissão Nacional de Direitos Humanos e Cidadania de Cabo Verde. O seminário teve lugar para celebrar o Orgulho e reuniu ativistas e organizações LGBTI locais com membros do governo de Cabo Verde e outras partes interessadas.
A 2 de novembro, a Embaixada de Portugal na Bulgária assinou uma declaração conjunta condenando os ataques anti-LGBTI contra o centro comunitário Rainbow Hub em Sofia.

LIBERDADE DE REUNIÃO
Devido à pandemia de COVID-19, a Comissão Organizadora decidiu cancelar a Marcha do Orgulho LGBTI+ de Lisboa. A ILGA Portugal também cancelou o Arraial Lisboa Pride, originalmente previsto para junho. Em vez disso, em julho a ILGA Portugal enviou 75.000 postais por Lisboa e arredores, para celebrar o número estimado de participantes e afirmar que todos os dias é Dia do Orgulho.

LIBERDADE DE ASSOCIAÇÃO
Em outubro, a TransMissão, organização trans e não binária, inaugurou o Espaço TRANS, o primeiro centro comunitário trans do país. O espaço está localizado em Almada e presta apoio entre pares, bem como organiza atividades e eventos diretamente relacionados com questões trans e não binárias.

SAÚDE
Em março, a Direção Geral de Saúde aboliu o período de diferimento para homens que fazem sexo com homens e querem doar sangue, o que foi saudado pela sociedade civil que há anos pressionava por essa mudança. Ainda em janeiro, vários gays relataram ter sido impedidos de doar. Em outubro, o parlamento aprovou uma série de projetos de lei que proíbem a discriminação em razão da orientação sexual, identidade de gênero e características sexuais no contexto de doações de sangue.

ATIVISMO PELOS DIREITOS HUMANOS
A ILGA Portugal celebrou este ano o seu 25º aniversário.

APOIO INSTITUCIONAL
O governo não tomou medidas para implementar as recomendações parlamentares para 2020 sobre a necessidade de fornecer apoio financeiro a organizações que atendem grupos vulneráveis ​​durante a pandemia de COVID-19.

Em outubro, a Secretaria de Estado para a Cidadania e Igualdade de Género e a Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género formalizaram uma doação de 60.000 euros para trabalhos focados nas temáticas LGBTI, que resultou em 10 projetos financiados.

RECONHECIMENTO JURÍDICO
Em 29 de junho, o Tribunal Constitucional pronunciou-se sobre a constitucionalidade do regulamento 7247/2019, que foi adotado como medida de execução da Lei de 2018 de reconhecimento de género. O Tribunal decidiu que o regulamento deveria ter sido aprovado pelo parlamento como legislação, e não introduzida pelo governo como uma medida de execução. A lei de 2018 introduziu o direito à autodeterminação da identidade de género e expressão de género e a proteção das características sexuais de cada pessoa. A decisão do Tribunal foi amplamente mal interpretada como derrubando a lei e declarando-a inconstitucional, o que não é o caso:
[esta] decisão deixa intocada a garantia do direito à identidade e expressão de género e a proibição de discriminação no sistema educativo” – Tribunal Constitucional
A 1 de julho, a sociedade civil instou o parlamento numa carta conjunta a iniciar imediatamente o processo legislativo para proteger crianças e jovens trans e intersexo.

A rede ex aequo criou o primeiro grupo de apoio nacional entre pares para jovens trans e publicou um guia para pessoas trans sobre como aceder aos seus direitos, incluindo o direito ao reconhecimento legal de género, saúde e educação específica para pessoas trans.

PARTICIPAÇÃO PÚBLICA, CULTURAL E VIDA POLÍTICA
Em setembro, a ILGA Portugal organizou cinco debates online com representantes de Faro, Setúbal, Lisboa, Coimbra e Porto, antes das eleições autárquicas portuguesas. Em Lisboa, e contrariamente aos resultados provisórios, foi nomeado um novo executivo de direita, com Carlos Moedas, ex-Comissário da UE para Pesquisa, Inovação e Ciência – sendo eleito Presidente da Câmara Municipal. Conhecida jornalista, Laurinda Alves, que já fez comentários homofóbicos e transfóbicos, foi eleita Vereadora dos Direitos Sociais.

POLÍCIA E APLICAÇÃO DA LEI
A 20 de novembro de 2021, a Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género, a Inspeção-Geral da Administração Interna, a Secretaria-Geral da Administração Interna e as três forças policiais em Portugal (PSP, GNR e SEF) assinaram um memorando de entendimento sobre Questões LGBTI, incluindo a prevenção de crimes de ódio e melhoria da investigação e apoio às vítimas LGBTI.

SEGURANÇA SOCIAL
Um grupo de ativistas iniciou uma angariação de fundos para estabelecer um abrigo para migrantes trans em Lisboa, chamado Casa T. Mais tarde, foram formalmente estabelecidos e obtiveram financiamento.


Para melhorar a situação legal e política das pessoas LGBTI em Portugal, a ILGA-Europe recomenda:

  • Proibir “terapias de conversão”;
  • Introduzir políticas públicas e outras medidas de asilo que contenham menção expressa a todos os fundamentos SOGIESC (orientação sexual, identidade de género, expressão de género, características sexuais);
  • Garantir serviços de saúde adequados e acessíveis para pessoas trans e com diversidade de género.

O relatório pode ser lido na íntegra AQUI [.pdf].


Ep.186 – Renaissance: A Film by Beyoncé (hmmm, yummy, yummy, yummy, make a bummy heated) Dar Voz a esQrever: Notícias, Cultura e Opinião LGBTI 🎙🏳️‍🌈

O CENTÉSIMO OCTAGÉSIMO SEXTO episódio do Podcast Dar Voz A esQrever 🎙️🏳️‍🌈 é apresentado por nós, Pedro Carreira e Nuno Miguel Gonçalves. Antes de darmos por terminada esta temporada do podcast, não podemos ficar indiferentes ao lançamento do incrível filme concerto Renaissance. Usamos os vários momentos documentais do backstage do concerto para falar um pouco da carreira de Beyoncé, focados, claro, no último álbum, Renaissance, inspirado na cena ballroom queer de Nova Iorque e no seu tio gay Johnny que morreu com VIH/SIDA. Voltamos em janeiro para mais uma temporada, que pode ser ligeiramente diferente a nível de periodicidade. Mas mais detalhes só em 2024. Boas festas a todes! 🎄 Artigos mencionados no episódio: Beyoncé lança trailer do filme da celebrada The Renaissance World Tour Beyoncé homenageia O’Shae Sibley, homem gay assassinado por dançar a sua música numa estação de serviço Beyoncé lança remix surpresa de ‘Break My Soul’ com icónica ‘Vogue’ de Madonna Beyoncé dedica álbum Renaissance ao seu tio gay Johnny O Amor (Inclusivo) de Beyoncé O “Chamamento às Armas” de Beyoncé Jingle por Hélder Baptista 🎧 Este Podcast faz parte do movimento #LGBTPodcasters 🏳️‍🌈 Para participarem e enviar perguntas que queiram ver respondidas no podcast contactem-nos via Twitter e Instagram (@esqrever) e para o e-mail geral@esqrever.com. E nudes já agora, prometemos responder a essas com prioridade máxima. Podem deixar-nos mensagens de voz utilizando o seguinte link, aproveitem para nos fazer questões, contar-nos experiências e histórias de embalar: https://anchor.fm/esqrever/message 🗣 – Até já unicórnios  — Send in a voice message: https://podcasters.spotify.com/pod/show/esqrever/message
  1. Ep.186 – Renaissance: A Film by Beyoncé (hmmm, yummy, yummy, yummy, make a bummy heated)
  2. Ep.185 – Podcast – Religião e LGBTIfobia?
  3. Ep.184 – ESPECIAL Madonna: It's a CELEBRATION (Tour)

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5 comentários

  1. Quando li “Asilo” me lembrei da Instituição para Idosos, que Independente de ser ou não hetero, sendo solteiro (a), há quem os interne, para morarem no imóvel do (a) idoso (a), sem terem que cuidar e, ainda alegam, que nos Asilos, há assistência médica mais regular e pessoas “treinadas” para cuidar! Minha tia, dentro da própria casa, ouviu a pergunta de um dos meus irmãos sobre a Escritura do Imóvel e, ele ficou surpreso que estava em gaveta, de fácil acesso!

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