Idadismo: A Maior Luta de Madonna

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“Pessoas que vêm ter comigo na rua e dizem ‘Madonna, fizeste tudo o que há para fazer na vida, o que vais fazer a seguir???’ Porquê? Fiquem calados. Quem é que diz que já fez tudo? É estúpido. As pessoas comentam o quão controversa sou. É verdade. Mas penso que a coisa mais controversa que já fiz é fazer o que faço por 34 anos. Por isso, se me apetecer, vou fazê-lo por mais 34. Ou 64. Ou 104. Ou durante o tempo que me apetecer. Parem de me limitar. Não perguntam isso a homens, pois não? Não, homens perguntam isso a mulheres. E mulheres perguntam isso a mulheres. Por isso pensem bem.”

Este poderá ser mesmo o maior legado de Madonna: a luta contra o idadismo. As palavras foram proferidas com muitos palavrões pelo meio num discurso irado mas cheio de humor de Madonna, num concerto de beneficência em Miami (na sua integridade em baixo com o discurso acima aos 50:15) a sua caridade Raising Malawi, com o intuito de permitir às raparigas e rapazes desse país uma educação digna.

Tudo isto também acontece num novo formato de concerto que Madonna tem vindo a experimentar, vestida de palhaço e de uma aproximação total ao público, com um alinhamento sempre inesperado e sem preocupação com os seus maiores sucessos. Há quem afirme que ela parece rídicula. Pela vestimenta circense, pela exibição inadequada das nádegas, pelas piadas mentecaptas. Pela postura ‘quero se que fodam‘. Tudo altamente repreensível para uma mulher. Ainda para mais com quase 60 anos. A resposta é pessoal mas sempre politizada, seja numa reinterpretação absolutamente transcendente de ‘Toxic’ de Britney Spears (no video aos 13:50) dirigida a Donald Trump ou um ‘American Life’ – um dos maiores discos do seu legado e mais actual e acutilante hoje que nunca – dirigido aos que não respeitam o povo indígena dos países que ocupam. Falava em particular do caso dos Nativo-Americanos, que foram confrontados com violência policial quando se manifestavam pacificamente contra a construção de um gasoduto no Dakota do Norte. Assim se combatem doenças sociais. Nem que isso implique partir as mandíbulas para abrir espaço e deixar o alimento entrar na goela.

Mas este discurso de limitação e silenciamento, que aconteceu desde o início da sua carreira e foi ficando mais intenso a partir do momento em que fez 30 anos, é recorrente e cada vez mais castrante. Já tínhamos falado aqui deste preconceito atroz para com a idade de uma mulher como a Madonna e como esse é provavelmente o seu maior feito de todos: lutar incessantemente contra ele e aqueles que a querem diminuir. Diariamente. Há 34 anos.

Muitos deles são críticos de sempre, muitos são fãs. É quase impossível olhar para uma mulher como Madonna de forma isenta. E sem influência da perspectivação social deturpada e cáustica com que fomos educados. Uma mulher não se deve comportar assim. Uma mulher educada não se deve comportar assim. Uma mulher desta idade não se deve comportar assim. Porque o nosso pensamento instantaneamente para aí navega. Estamos programados para isso. Mas o radicalismo de Madonna sempre esteve aqui para apagar formatações e fronteiras. E vai continuar. Mesmo com o Mundo contra ela vai continuar. Porque a luta é infinita. E precisa dos nossos punhos e do nosso sangue.


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Respostas de 4 a “Idadismo: A Maior Luta de Madonna”

  1. […] que há muito não se fazia sentir. Aos 60 anos de idade poderia ter desistido de combater o idadismo latente dos artigos que lhe são dedicados. Todos. Sem excepção. Mas em lugar de se deixar vencer ela […]

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  2. […] Madonna significa muita coisa diferente para muita gente. Quase quatro décadas depois do início da carreira, continua a ser debatido se possui algum talento, se detém alguma capacidade vocal, se tem qualquer dote musical de todo. Continua-se a atribuir-lhe sorte desmesurada em ter conseguido atingir esta longevidade, muitas vezes conferindo-lhe apenas a qualidade de saber reunir (ou foder) as pessoas certas. Não só é uma perspetiva tremendamente falaciosa, mas tremendamente machista. E cada vez mais idadista.  […]

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  3. […] continua assim, em simultâneo, a combater o idadismo e a discriminação contra pessoas […]

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  4. […] 62 anos, Moore ainda enfrenta o desafio das normas etárias que, até recentemente, marginalizavam mulheres ao ponto de as tornarem “quase assexuadas” após uma certa idade. Quando surgiu em Charlie’s Angels: Full Throttle, aos 40, Moore causou um furor ao aparecer […]

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